24
de abril de 2013 | N° 17412
MARTHA
MEDEIROS
Dia do
Vizinho
As
redes sociais são mesmo sociais? Temos testemunhado uma eletrizante troca de
informações entre smartphones, mas socializar, pra valer, exige mais dedicação
do que uma simples teclada. É por isso que um movimento está sendo articulado
na Inglaterra por um grupo de simpatizantes do olho no olho. Eles estão
tentando implementar por lá o Neighborday, ou o Dia do Vizinho. A data proposta
é agora, dia 27 de abril.
No
prédio em que eu morava anteriormente, tive três vizinhas de quem fiquei amiga:
a Dedé, com quem ainda cruzo pelas ruas, a Heloisa, que hoje vive na Suécia, e
a Bebel, que durante anos ilustrou minha página no ZH Donna.
No prédio
em que moro atualmente, há aqueles com quem tenho alguma afinidade, uma
história já compartilhada, mas não sei o nome de todos e já passei alguns
vexames por causa disso. Minha interação, se é que se pode chamar assim,
acontece basicamente no elevador e na garagem: nunca fiz visitas, nem os
convidei a virem ao meu apartamento.
Não
sei se entre eles há o costume de confraternizarem, de darem uma esticadinha
juntos após a reunião de condomínio. Se sim, é louvável, mas não estou
reivindicando inclusão. Me sentiria parte de um sindicato, de uma agremiação,
de uma confraria, e vim ao mundo sem esse perfil comunitário. Não chega a ser
um defeito de caráter, espero.
Deve
ser consequência desses tempos individualistas e apressados dos adultos. Quando
criança, era diferente. Morava num pequeno edifício, numa rua tranquila, e
conhecia toda a garotada, de esquina a esquina. Vivíamos soltos, brincávamos
com argila, andávamos de bicicleta, frequentávamos a casa uns dos outros.
Flavia,
Miguel, Vera Lucia, Suzana, Artur, Roberta, Ovelha. Lembro de todos, a Flavia e
o Miguel ainda vejo. Aquilo não era política de boa vizinhança, e sim um
encontro espontâneo. Não se exigiam afinidades, boas maneiras, interesses
comuns. Bastava uma Monareta e já ter feito a lição de casa para entrar para a
gangue.
Crescemos,
e as cidades também. Ao menos nos grandes centros, os vizinhos já não deixam a
porta destrancada, não há mais o ritual de colocar as cadeiras na calçada para
tomar um chimarrão, e se pedirmos uma xícara de açúcar, um ovo, um fio de
azeite, é capaz de soar como invasão de privacidade. Uma pena.
Espero
que ao menos esse hábito ainda esteja preservado, pois acho a parte mais bonita
de se compartilhar o mesmo endereço: a troca, o pedir e o emprestar, o S.O.S.
afetivo – quem já não ficou desprevenido e pediu para o vizinho um toco de vela
ou licença para dar um telefonema? Nossa, deixe eu tirar o pó dos meus ombros.
Sou do tempo em que se dava um telefonema na casa dos outros quando a nossa
linha era cortada.
Próximo
sábado, então, será o primeiro dia do vizinho. Não sei se a proposta dos
ingleses, que almejam estimular o mundo todo, vai pegar, mas encaro como uma
simpática reivindicação por mais cordialidade real – não real no sentido
monárquico do termo, mas real como a vida tem que ser, como a vida é, ou como
já foi um dia.
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