18
de abril de 2013 | N° 17406
L.
F. VERISSIMO
Imagens
Na
investigação desse atentado em Boston, a polícia e o FBI têm a sua disposição
as imagens de dezenas de câmeras de circuito fechado dispostas em postes,
frentes de lojas e portarias de edifícios ao longo do percurso da maratona. E
contarão com as imagens gravadas nos celulares e câmeras portáteis de
participantes e assistentes da maratona, num número incalculável.
Talvez
esta megacobertura não ajude em nada, mas o fato é que vivemos na era do
registro universal, em que, pelo menos em tese, nenhum movimento do cidadão de
uma cidade moderna deixa de ser captado ou – se for um criminoso – flagrado.
Cheguei a imaginar como seria um filme que contasse a vida de algum
representante da nossa espécie e da nossa época apenas através de registros
selecionados, do teipe do seu parto, gravado pelo pai, através de todos os
super-8 da sua infância e juventude, até a gravação da sua posse como ministro
ou do seu assalto a uma mercearia abanando para a câmera, a escolher.
Também
se pode especular como teria sido a história do mundo se detalhes dos seus
grandes momentos ou de suas passagens mais terríveis tivessem o escrutínio
eletrônico de hoje. Na ausência da câmera onipresente, os acontecimentos eram
conhecidos por testemunhos pouco confiáveis, que transformavam banalidades em
feitos heroicos e barbaridades em mitos.
Hoje
se sabe que o repúdio do público americano à guerra no Vietnã cresceu porque
aquela foi a primeira guerra com cobertura instantânea da História, a primeira
que não foi mostrada em filmes desatualizados, mas gravada e despejada
diariamente pela TV no tapete da sala.
E
não é preciso ir muito longe. Imagine se na tropa que acompanhava dom Pedro I
às margens do Ipiranga houvesse uns quatro ou cinco celulares gravando tudo. A
cena da proclamação da nossa independência certamente não seria tão retumbante.
A cena retratada na pintura famosa é mais bonita, mas é falsa. Ou – para quem
acha que entre o fato e a lenda deve-se sempre publicar a lenda – é falsa, mas
é mais bonita.
Crônica
vovô
Tenho
uma poltrona para ler os jornais, ver TV e, eventualmente, cochilar na sala.
Tenho, não. Tinha. Nossa neta Lucinda descobriu que o melhor lugar para
assistir a seus programas é a mesma poltrona. Não concorda que na poltrona,
apertando um pouco, cabem dois. Só faz concessão na hora do Jornal Nacional,
quando permite minha reintegração de posse.
No
resto do tempo, a poltrona é dela, e meus protestos são recebidos com
indiferença ou ironia. No outro dia, diante de mais uma reivindicação dos meus
direitos, ela tapou a boca com a mão para eu não ouvir e disse: “Vovô pirou”.
Enfim, estou envolvido numa guerra por território, com poucas possibilidades de
vitória.
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