quarta-feira, 17 de abril de 2013


ALEXANDRE SCHWARTSMAN

Inflação, tomates e outros pepinos

O pepino não é o tomate, mas ambições de continuidade política sem preocupação genuína com o bem-estar O carnaval em torno do preço do tomate pode levar alguns a acreditar que o vegetal em questão seja o grande vilão da escalada inflacionária. Não é o caso.

Embora seja verdade que seu preço tenha subido mais do que 120% nos últimos 12 meses, justificando a ira dos consumidores, seu peso é pequeno no orçamento médio considerado pelo IBGE. Há um ano era apenas 0,18% (ou seja, de cada R$ 100 gastos, apenas R$ 0,18 era destinado ao tomate); hoje, é R$ 0,33 a cada R$ 100.

Assim, da inflação de 6,59% registrada nos últimos 12 meses, considerando participação média do tomate no orçamento familiar, sua contribuição foi de 0,22%.

Por outro lado, a redução de 16% das tarifas de energia elétrica no mesmo período contribuiu para reduzir o índice de preços em 0,52%, já que esse item representa cerca de R$ 3,30 para cada R$ 100 gastos.

Há, portanto, produtos que empurraram o índice ladeira acima, assim como outros que agiram no sentido oposto. Se quisermos determinar se o IPCA mais alto é mesmo o resultado de uns poucos aumentos pontuais de preços ou se, ao contrário, reflete desequilíbrios mais profundos, não faz sentido destacar apenas os primeiros, desconsiderando o efeito dos segundos.

Precisamos, portanto, analisar medidas de inflação que atenuem o efeito dos preços mais voláteis, os chamados núcleos de inflação.

Caso os núcleos contem uma história muito diferente da inflação "cheia", por exemplo, mostrando taxas de inflação muito inferiores à registrada pelo IPCA, há boa chance de a aceleração inflacionária ser resultado de um choque localizado, como preços de alimentos.

Já se as histórias são semelhantes, fica difícil justificar a inflação mais alta apenas como fruto do preço do tomate.

Entre essas medidas, uma das mais simples consiste no expurgo dos preços de alimentos (justamente para eliminar os efeitos de choques de oferta), assim como dos "preços administrados", na prática determinados por contratos de prazo mais longo e decisões governamentais (combustíveis, por exemplo). De acordo com ela, os preços dos produtos que não são alimentos nem "administrados" subiram à velocidade média de 6,46% nos últimos 12 meses, apenas marginalmente inferior à inflação "cheia".

Há outras medidas de núcleos de inflação (são cinco!), mas a conclusão é essencialmente a mesma. A média delas aponta para inflação de 6,11% em 12 meses, sugerindo que, ao contrário da versão oficial, a aceleração não se deve a alimentos ou a nenhum grupo de produtos em particular.

De fato, complementando a análise acima, podemos utilizar outra medida, o "índice de difusão", que mede simplesmente a proporção de produtos entre os 365 componentes do IPCA cujos preços tenham aumentado no mês.

O raciocínio é semelhante ao exposto acima: caso a aceleração do IPCA resulte de um punhado de produtos, enquanto a maioria registra estabilidade ou queda, o índice de preços provavelmente estará capturando o efeito de um choque localizado; já indicações que os aumentos de preços são disseminados sugerem que o problema é mais profundo.

Ocorre que, desde julho de 2012, o indicador de difusão tem registrado valores recordes em todos os meses (desde 2005, quando a meta de inflação foi fixada em 4,5%), também uma indicação que não se trata da elevação de uns poucos preços afetando a medida de inflação, mas de um aumento generalizado.

Os números acima desmentem, portanto, a narrativa oficial, que insiste em atribuir aos alimentos o protagonismo na aceleração da inflação. As causas são mais profundas, refletindo políticas incompatíveis com a inflação na meta.

Lendo, porém, que no Planalto se considera que crescimento de 3% e inflação ao redor de 6% bastam para garantir a reeleição, fica claro que o verdadeiro pepino não é o tomate, mas ambições de continuidade política sem preocupação genuína com o bem-estar da população.

alexandre.schwartsman@hotmail.com

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