20
de abril de 2013 | N° 17408
NILSON SOUZA
Protagonistas
O
indiozinho simpático me olha de trás de uma placa de trânsito enquanto espero o
sinal verde. Habitante irreal desta cidade, ele representa a luta solitária de
um artista de rua pela preservação da cultura indígena e da natureza. Chama-se Xadalu,
mas não é uma criatura de carne e osso. Existe só nos adesivos colados
estrategicamente em pontos movimentados da Zona Sul para chamar a atenção dos
passantes. A campanha anônima tem o mérito de provocar a curiosidade das
pessoas para uma boa causa.
Corta
para a realidade.
Na
feira ecológica que frequento aos sábados, os índios caingangues estão sempre
presentes. São meninos e meninas de pele morena e olhos escuros, que oferecem
artesanato de vime e buquês de marcela para a freguesia. Alguns pedem moedas.
Sempre tem um adulto por perto, mas o exercício da mendicância é das crianças,
que circulam incansáveis entre os compradores de frutas e verduras.
Corta
para Brasília.
Esta
semana, uma tribo inteira composta por índios de várias etnias ingressou no
plenário da Câmara Federal, cantando e dançando ao som de chocalhos, para
protestar contra a proposta de emenda constitucional que transfere para o
Legislativo a prerrogativa de demarcação de terras indígenas, hoje
exclusividade do Executivo. Os manifestantes, que não quebraram nada e
aceitaram o pedido do presidente da Casa para negociar pacificamente, alegam
que não têm representação parlamentar e que os ruralistas estariam em vantagem
na hora de discutir a posse de propriedades.
Corta
para a História.
Como
todos sabemos, os índios eram donos destas terras antes da invasão europeia.
Dominavam as matas e os litorais, caçavam e pescavam, viviam a sua vidinha
pelada até a primeira caravela aparecer no horizonte. Tinham lá as suas guerras
tribais, é verdade, mas no geral eram pacíficos. Tanto que caíram na armadilha
dos espelhinhos e miçangas, e acabaram escravizados, dizimados, sarampados.
Corta
para a conclusão.
Sinceramente,
embora me comova com a situação, não sinto culpa atávica pelo que meus/seus/nossos
tataravós europeus fizeram. Acho mesmo que apenas assumir este pecado original
não atenua os danos passados. E o importante é o presente. Mas não há dúvida de
que a sociedade brasileira exclui os índios e os considera cidadãos de segunda
classe.
Sei
que estão protegidos por leis, por órgãos públicos, por ONGs, e que ganharam
até um dia especial (ontem), mas a verdade é que já foram protagonistas de
nossa história e hoje, com as exceções de sempre, estão transformados em
pedintes.
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