14
de abril de 2013 | N° 17402
PAULO
SANT’ANA
Simples sambas
Noel
Rosa foi grande e talvez o maior de todos os compositores brasileiros porque
era simples.
A
simplicidade, no meu entender, é o grande segredo da arte.
Um
dos maiores sucessos de Noel é aquele samba: “O orvalho vem caindo/ vai molhar
o meu chapéu/ e aos poucos vão surgindo/ as estrelas lá no céu/ Tenho passado tão
mal/ a minha cama é uma folha de jornal/ O meu lençol é um lindo céu de anil/ e
o meu despertador é um guarda-civil/ que o salário ainda não viu”.
Noel
Rosa tinha apenas 22 anos quando compôs esse samba. Não entendo como pôde caber
na cabeça de um garoto de 22 anos a inspiração larga de um samba desses.
Se
eu fosse digno de ir para o céu, o primeiro grupo para quem eu queria ser
apresentado lá por São Pedro teria os seguintes integrantes: Noel Rosa, Chico
Buarque de Holanda, o poeta Augusto dos Anjos, Lupicínio Rodrigues, Mario
Quintana, o cantor e compositor João Nogueira, Millôr Fernandes, Nelson
Rodrigues e Cartola.
Como
eu iria me refestelar e me exibir nessa roda de luxo!
Mas
vocês viram que Noel Rosa, no samba com que iniciei a coluna, se põe no lugar
de um morador de rua, que dorme na calçada com os jornais sob o corpo.
Chico
Buarque em muito se inspirou em Noel Rosa e fez um samba, não me lembro da
letra nem do nome, em que reflete um casal que é morador de rua.
E,
na letra do samba, o casal está dormindo numa noite de chuva, sob uma marquise,
fazendo amor em cima dos jornais úmidos.
E,
quando o casal nu se levanta, pode-se notar nas costas dos dois, impressas, as
manchetes de jornais.
É um
momento altíssimo da poesia de Chico Buarque.
Falando
em momento alto, é preciso cultuar a poesia musical do autor de Ronda, Paulo
Vanzolini, o samba mais gravado por todos os intérpretes na história da música
brasileira.
Vanzolini
fez o Samba Erudito: “Andei sobre as águas/ como São Pedro/ como Santos Dumont
fui aos ares sem medo/ fui ao fundo do mar como o velho Piccard/ só pra me
exibir/ só pra te impressionar/ fiz uma poesia como Olavo Bilac/ soltei
filipetas pra te dar um Cadillac/ você nem ligou para tanta proeza/ foi um preço
tão alto na sua beleza/ então como Churchill voltei outra vez/ mas você foi
demais pra paciência do inglês/ então me curvei ante a força dos fatos/ lavei
minhas mãos como Pôncio Pilatos”.
Esse
samba de Paulo Vanzolini recebeu o seguinte elogio de Chico Buarque: “É talvez
o único samba que não é meu que eu gostaria que fosse meu”.
E
Chico gravou esse samba.
Nenhum comentário:
Postar um comentário