sexta-feira, 25 de junho de 2010


JOSÉ SARNEY

Canção da Copa

Nenhuma Copa empolgou tanto o Brasil quanto a de 70. Ela marcou o nosso povo e o povo mexicano. Quinze anos depois, quando presidente da República, visitei Guadalajara; as casas estavam enfeitadas com a bandeira de nossa pátria e eles gritavam: "Viva Brasil! Viva Brasil! Pelé!".

Mas eu queria relembrar o motor da mobilização nacional, cantada pelo país inteiro, que foi o "Hino da Seleção", feito por Miguel Gustavo, este pioneiro do jingle, esse gênio do gosto popular -"Noventa milhões em ação / Pra frente Brasil / Salve a seleção!".

Os jingles de Miguel Gustavo invadiam as mentes das pessoas, que ficavam com eles na cabeça, cantarolando todo o tempo, e eram transformados em marchinhas de Carnaval. Dois exemplos: os porquinhos das Casas da Banha, que ele criou e popularizou, e a "Revista do Rádio", que arrasou no Carnaval de 58: "Ela é fã da Emilinha / Não sai do César de Alencar / Grita o nome do Caubi / E depois de desmaiar / Pega a "Revista do Rádio" / E começa a se abanar...".

Elegeu o Jango com o célebre "Jangar". "Pra vice-presidente / minha gente eu vou jangar / é Jango, é Jango / é o Jango Goulart". Era uma mensagem subliminar de juntar o Jânio da UDN com o Jango do PTB, o famoso Jan-Jan. Resultado (naquele tempo podia), o presidente de um partido e o vice do outro lado.

Desfrutei do seu talento, tornei-me seu amigo e senti profundamente sua perda prematura. Nas 12 eleições em que concorri, não abandonei o seu slogan, repetido num baião nordestino: "Meu voto é minha lei / Pra deputado José Sarney", cantado por Luís Vieira e Elizeth Cardoso.

Nesta Copa da África do Sul, confesso que não acho graça nas vuvuzelas. São sem gosto e interferem, indigestas, na alegria e nas cores que enfeitam e explodem dos torcedores. Mas tudo muda, e de mudanças são feitos o mundo e as Copas.

A alegria do Brasil, identidade do povo brasileiro, veio numa contradição infame da África, que do sofrimento dos negros tirou a única coisa boa de que podiam desfrutar, a força da alegria, para enfrentar a tragédia.

A alegria da África do Sul, vibrando mesmo depois da derrota, mostra que ela é mais forte do que o próprio destino. Não quero fazer uma crônica nostálgica. Quero a vitória do Brasil, agora 200 milhões em ação, vibrando com a seleção. Que venha o Hexa.

Se não vier de Johannesburgo, virá de outro lugar. Quem viver verá. E sempre seja lembrado Miguel Gustavo, o cancioneiro das Copas.

JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.

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