sábado, 19 de junho de 2010



20 de junho de 2010 | N° 16372
DAVID COIMBRA


Considerações sobre o corpo feminino

A mais famosa do mundo

Daqui, da velha África, partiu muito do melhor que há no Brasil. Partiu em amaldiçoados navios negreiros, partiu a ferros, mas aí, do outro lado do Mar Tenebroso, vigorou e vicejou e, agora, encanta o mundo.

Falo da bunda.

A formosa bunda das brasileiras é herança da África. Vá à Europa e você saberá do que falo. As europeias têm bundas melancólicas. As brasileiras, não. As das brasileiras são joviais e empinadas, como as das africanas. Pedi que o fotógrafo Emerson Souza registrasse alguns exemplares que ondulam pelas sedes da Copa. Ele cumpriu a pauta com gosto.

Pois bem. Agora farei uma afirmação forte, que pode motivar intensa polêmica. A seguinte:

A bunda mais famosa do mundo é da África do Sul.

Refleti muito antes de escrever isso, por saber que há centenas de exemplares célebres rebolando por aí. Eu mesmo conheço alguns de fazer marejar os olhos. Nenhuma, porém, foi tratada como a de Sarah Baartman, a chamada “Vênus Hotentote”.

Os hotentotes são um povo nativo da África do Sul. Bem. As mulheres hotentotes são dotadas de nádegas pronunciadas que muito agradam aos europeus, em especial aos portugueses, esses malandros.

Aliás, foram eles, os portugueses, que inventaram a palavra bunda. Inventaram no Brasil, por causa das africanas. É que as escravas chegavam ao Brasil com suas belas e luzidias e redondas nádegas, e os portugueses olhavam e diziam “Oh”.

Ora, os povos negros da África, em geral diz-se que eles falam a língua “bundo”. Logo, os portugueses os chamavam de “bundos”. Mas as bundas dos bundos era o que mais atraía a atenção dos portugueses. De certa forma, eles viam aqueles bundos, ou, antes, suas mulheres, como imensas bundas.

Só que aí aconteceu algo curioso: os portugueses não passaram a chamar aquele povo de “os nádegos”. Em vez disso, renomearam todas as nádegas do mundo e passaram a denominá-las de “bundas”, o que, de certa maneira, é uma homenagem dos portugueses. Afinal, mesmo as nádegas das portuguesas, por sem graça que sejam, são, hoje, chamadas de bundas.

Mas voltemos às hotentotes. Ocorre que elas, as hotentotes, são conhecidas por suas enormes bundas, além de outros atributos dos quais falarei em seguida. Só que essa moça, Sarah Baartman, tinha uma derrière ainda maior.

Tanto que um médico inglês convenceu-a a embarcar com ele para Londres, sob a promessa de que, na Europa, ela faria carreira artística e enriqueceria. Sarah, como muitas brasileirinhas do século 21, acreditou e atravessou o oceano. Em Londres, foi exposta no circo como uma aberração. Os ingleses faziam fila para vê-la. Se pagassem algumas libras a mais, podiam afagá-la e boliná-la à vontade.

Aquela pelotense que venceu recentemente o concurso de melhor bunda do planeta (mais uma façanha do Rio Grande amado!), Melanie, ela proferiu uma frase imortal:

– Eu não pertenço à minha bunda, ela é que me pertence.

Percuciente e delicioso raciocínio. Que não se aplicava a Sarah. Sarah pertencia a sua bunda, que, segundo medições britânicas, estendia-se por 50 centímetros – o equivalente a um terço de sua altura (1m50cm), que espetáculo.

Sarah possuía outra característica das hotentotes: sua genitália era bem maior do que a das europeias. Os pequenos lábios das hotentotes, quando elas estão de pé, podem chegar a 10 centímetros, que coisa. Os empresários que exploravam Sarah queriam expor também essa sua peculiaridade, mas isso ela nunca topou.

Depois de ser exibida para os londrinos, Sarah foi levada para Paris. Passados alguns meses, os franceses se cansaram dela, e Sarah caiu na prostituição. Morreu em 1815, provavelmente de sífilis, aos 25 anos de idade.

Nem morta ela descansou. Os médicos conservaram seu corpo e puderam, enfim, exibir sua genitália em museu. Quando Nelson Mandela foi eleito, conseguiu repatriar o corpo de Sarah Bartmann, e ela foi sepultada em sua terra natal, onde, depois de 200 anos, finalmente encontrou a paz.

É daqui, portanto, a mais famosa bunda do mundo. Pena que tenha sido uma triste. Como elas jamais devem ser.

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