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sábado, 26 de junho de 2010
27 de junho de 2010 | N° 16379
MOACYR SCLIAR
A rótula e a sinaleira
Não são apenas duas maneiras diferentes de encarar o trânsito. São duas formas de encarar a vida
Nosso prefeito José Fortunati está anunciando para fevereiro a retirada da rótula da Avenida Nilo Peçanha, um local que, em entrevista a ZH, ele classificou como gargalo do trânsito. Adequadamente, aliás: quem passa por ali, sobretudo no final da tarde, fica espantado com o tamanho da fila de veículos. Vamos esperar que agora o problema seja resolvido.
A medida enseja uma reflexão. Rótula e sinaleira não são apenas maneiras diferentes de orientar o trânsito: são duas formas de encarar a vida, da qual o trânsito hoje é, infelizmente, parte importante. Dois símbolos, para dizer a verdade.
A sinaleira (o termo é um gauchismo; em outros lugares o pessoal fala de “sinal” ou “semáforo”) representa, em primeiro lugar, a autoridade. Dá-nos ordens: para, fica atento, pode passar.
E o faz através da tecnologia, que permite a troca dos sinais de maneira automática, neutra; isso, naturalmente, quando não falta energia, ou quando a sinaleira não está estragada. De qualquer modo a sinaleira é uma evidência de progresso. Para uma localidade pequena, a primeira sinaleira equivale a um reconhecimento de sua importância, ao ingresso no rol das grandes cidades.
A rótula é diferente. Também tem atrás de si a autoridade, representada pelas placas de “Pare” e “Dê preferência para quem está na rotatória”, mas a partir daí tudo depende do motorista. E este é o problema. Os motoristas não são todos iguais, não são produtos de uma tecnologia, não são previsíveis.
São pessoas, são seres humanos, e nos seres humanos o processo decisório (acelerar? Frear?) resulta de uma combinação de elementos racionais com elementos emocionais, em proporções muito variáveis, isso sem falar de fatores outros, até de natureza fisiológica, como a visão, a velocidade de resposta motora.
Quando vamos entrar na rótula temos de resolver: dá para entrar agora? Tenho de esperar mais um pouco? Aquele cara que vem ali vai me deixar passar? Na imensa maioria das vezes a gente decide certo (não fosse assim a rótula não existiria) mas acidentes acontecem, e no caso da rótula da Nilo dão prova disso os cacos de vidro sobre o asfalto que a gente volta e meia ali encontra.
No Brasil o problema é grandemente complicado pela relação das pessoas com o automóvel, no passado visto como um símbolo de status, de riqueza e de poder. É verdade que houve uma democratização desse mercado: muita gente está comprando carro. De qualquer forma, existem pessoas que mudam de personalidade ao volante, uma espécie de fenômeno Dr. Jeckyll-Mr.Hyde, que Robert Louis Stevenson descreveu em O Médico e o Monstro.
E aí a arrogância, a ansiedade, o descaso passam a formar uma combinação muito perigosa. A rótula poderia desempenhar um papel educativo e até terapêutico, mas para isso seria preciso que em cada acesso houvesse um psicanalista de plantão, ao lado de um divã; o motorista pararia, desceria, deitaria no divã, discutiria seus problemas e depois voltaria ao tráfego.
Mas isso, claro, agravaria ainda mais o fenômeno do gargalo. Deve ser esta a razão pela qual a prefeitura (como está acontecendo em muitos lugares) optou pela sinaleira; agora os motoristas não terão mais de se debater em dúvidas. Eles simplesmente obedecerão.
Aquilo que, num regime político seria uma alternativa autoritária, talvez represente uma solução prática para o tráfego. Mas vamos esperar que, no dia do Juízo Final, o acesso ao paraíso se faça por meio de uma virtuosa e sensata rótula.
Agradeço as mensagens de Gilda Machado, Samuel Breitman, Nelson Gehm, Janete Cantergi, Adair Philippsen, Vanderlino Ramage, Sirley Bewian, Marta Chaves e Renato Lampert.
A Candice Soldatelli manda um nome que condiciona destino e que ela descobriu na revista Vogue: trata-se de uma arquiteta baiana que se chama Adriana Varandas. Quando vocês tiverem uma varanda para decorar, já sabem: chamem a Adriana.
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