quinta-feira, 17 de junho de 2010



17 de junho de 2010 | N° 16369
L. F. VERISSIMO


O Dunga do Dunga

Quando jogava, o Dunga se impunha pelo seu jeitão tosco, mas efetivo, e pelo seu comando. Não era raro ralhar com um companheiro ou exigir dos outros a mesma garra com que jogava.

A seleção campeã da Copa de 94 nos Estados Unidos se organizou em torno do núcleo duro do time, que era o Dunga. A de 98, na França, também, e só não venceu de novo por um conjunto de circunstâncias misteriosas – a síncope do Ronaldo, os gols de cabeça do Zidane – que nunca mais se repetiram.

A única vez, depois do jogo final Brasil x França de 98, em que o Zidane deu uma cabeceada com sucesso foi no peito daquele italiano que xingou sua mãe, na final da Copa de 2006. Mas pode-se dizer que o Brasil chegou à final na França, em grande parte, devido à liderança do Dunga dentro do campo.

Está faltando um Dunga na Seleção do Dunga. Ou talvez ele já exista, mas ainda não se identificou. Ninguém do nosso meio-campo atual parece ter a mesma imposição sobre o time que tinha o Dunga.

Talvez o próprio Dunga tenha decidido que um Dunga fora do campo dispense um Dunga lá dentro. Talvez esteja, vaidosamente, protegendo seu legado: ninguém mais depois dele pode ser Dunga, nem como metáfora. Não sei. O fato é que fica a pergunta. Quem é o Dunga do Dunga?

Depois de ontem o apelido da seleção espanhola precisa ser revisto. Em vez de “Fúria”, “Raiva”. Perder para a Suíça tem que dar raiva. Equivale a ser atropelado por um patinete. Pior do que a dor física é o constrangimento moral, e o que você vai dizer em casa.

Se bem que... A Suíça, apesar de não ter uma grande tradição futebolística, produz bons jogadores, com muita ajuda da sua mescla de culturas e da imigração. (Fui olhar a lista de jogadores inscritos da Suíça e dei até com um Tranquillo Barnetta).

O Gelson Fernandes, autor do único gol da partida de ontem, tem mais pinta de centroavante da Nigéria do que de qualquer variedade de suíço. E, como muitos outros do time, joga no Exterior. Assim, a Espanha não pode alegar que o frio alpino que está fazendo na África do Sul ajudou os suíços. Seu único consolo é que o time da Suíça não é exatamente um patinete.

Os fatos mais comentados da noite de terça-feira foram, pela ordem: o frio, o frio, o frio, o gol do Maicon, o gol do Robinho, o casacão do Dunga e o frio. Pela primeira vez na minha vida, senti algum tipo de identificação com o mundo inanimado. Me senti como um picolé.

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