terça-feira, 15 de junho de 2010



15 de junho de 2010 | N° 16367
DAVID COIMBRA


Um minuto com Blatter

Entrevistei o presidente da Fifa, Joseph Blatter, ontem à tarde.

Uma entrevista espetacular e exclusiva de um minuto de duração.

Aconteceu assim: depois do jogo Holanda versus Dinamarca, eu, o Potter e o Cosme Rímoli resolvemos que não iríamos descer pelas amplas rampas por onde escoa a torcida, ainda que as amplas rampas sejam amplas.

Queríamos um caminho mais liberado. Abrimos uma porta que dá para a escadaria que leva aos camarotes e fomos nos infiltrando pelos corredores do Soccer City. Os voluntários até fizeram menção de nos barrar, mas demonstramos tanta confiança que eles não nos incomodaram. Talvez para não se incomodar.

Descíamos os degraus da primeira escadaria quando uma porta no corredor à nossa frente se abriu, e por ela passou Joseph Blatter acompanhado por sisuda comitiva. Não perdi a chance. Perguntei-lhe qual era o seu time favorito para vencer a Copa do Mundo.

– Um dos finalistas – brincou, sorrindo.

– Mas qual é, realmente, o seu favorito? – insisti.

– Me desculpe, considere a minha posição. Não posso falar sobre isso – disse, educado, sorrindo sempre.

Então, olhou para o uniforme da RBS que eu vestia, identificou a bandeirinha do Brasil costurada na manga do blusão e repetiu, desta vez em espanhol:

– Desculpe, não posso falar sobre isso.

E se foi, ladeado por assessores tantos, que o escoltaram até que embarcasse em um Hyundai negro.

A emoção loira e laranja da seleção da Holanda

No lado de fora do Soccer City, 25 holandesas loiras, de minissaia cor-de-laranja, caminhavam sobre suas longas pernas de louça, algumas bebendo cerveja Castle no gargalo, outras simplesmente sorrindo seus sorrisos de loiras. No meio delas e abaixo delas, já que ele lhes batia pelos ombros, Luciano Potter empunhava uma câmera de vídeo e ofegava. Foi uma emoção para Potter, meu amigo e colega do Pretinho Básico. A única, até que o árbitro apitou o final de Holanda versus Dinamarca, o jogo do começo da tarde de ontem.

Fomos ao jogo porque era para ser um jogão. Não foi. A Dinamarca, que um dia os mais entusiasmados chamaram de Dinamáquina, hoje é, no máximo, Dinamarca-marca-marca. Porque é só isso que ela faz: só marca, não joga. Entrou em campo para arrancar um empate da Holanda. Não conseguiu. Levou 2 a 0.

Nada de perder tempo analisando a Dinamarca, portanto. Esse time não vai longe. A Holanda é de outra estirpe. Ontem, deixou-se prender pelo cipoal defensivo da Dinamarca, mas mostrou certos predicados, além dos joelhos dourados das loiras nas arquibancadas.

Campo lotado

A Holanda joga num 3-3-3-1, se é que esse sistema existe. Uma forma densa de jogar. O campo fica todo preenchido, mas o único atacante, Robin van Persie, sofre com uma solidão patética lá nas cercanias da área inimiga. E como a Holanda não tem mais nenhum Cruyff, nenhum Van Basten, só abriu o placar graças a um gol contra. O lateral Poulsen cabeceou para o lado, a bola bateu nas costas de um colega de defesa e entrou. Isso a um minuto do segundo tempo.

Tudo ficou mais fácil para a velha Laranja Mecânica, sobretudo porque o técnico Van Marwij colocou em campo o lépido Elia, um autêntico ponta, lídimo herdeiro de Zequinha, Vaguinho e Cafuringa.

Esse Elia é driblador, é um azougue, ele vai à linha de fundo e cruza, ou chuta em diagonal. Numa dessas, aos 39 minutos, a bola bateu na trave, voltou para a área, e Kuyt empurrou para o gol. Todos os holandeses correram para abraçar o pontinha, não o autor do gol.

Se ele ganhar a posição; se Robben, que está machucado, se recuperar; se, em Robben se recuperando, voltar a jogar bem; se tudo isso acontecer, a Holanda pode ser candidata a finalista. Mas é muito se para um time só. Melhor contar com a bela atuação das loiras reluzindo do lado de fora do estádio, elas com suas pernas sem fim, seus lábios rosados, seus olhos cor de anil.

Um momento ternura na África

Era noite, já, fazia algum frio e voltávamos do treino do Brasil rumo à pousada onde está hospedada a maior parte da equipe da RBS em Joanesburgo. Rodávamos em silêncio na nossa van, cada qual com seus pensamentos. Então, o Roberto Alves contou que, quando era apenas um meninote que corria descalço pela Ilha de Santa Catarina, teve a fortuna de conhecer o cantor Ataulfo Alves. Emoção demais para o pequeno Roberto, ele que desde sempre foi um aficionado por rádio.

Robertinho, já naquele tempo um ousado, conversou com Ataulfo. Que, encantado com o interesse do garoto, cantou-lhe uma canção com sua voz de rouxinol. Roberto jamais a ouvira até então, e jamais a esqueceu desde então.

– É a única música de que sei toda a letra – disse.

E, a nosso pedido, cantou-a no escuro da van. Tratava-se da célebre Saudade da Professorinha, que Roberto entoou com paixão e que nós aplaudimos com emoção. Um momento lírico na noite africana.

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