domingo, 27 de junho de 2010


ELIO GASPARI

Dilma e Serra são parceiros de um fracasso

Desde 1998, o governo não consegue receber das operadoras privadas de saúde o ressarcimento do SUS


O CERIMONIAL DAS campanhas eleitorais determina que a oposição prometa rios de mel, os governistas digam que eles já existem e ambos joguem os problemas sobre as costas dos outros.
Dilma Rousseff e José Serra formam uma dupla rara. Compartilham em silêncio pelo menos um desastre e poderiam explicar à patuleia o que pretendem fazer para consertá-lo. Trata-se de discutir a ruína do ressarcimento ao SUS dos custos que caem sobre a rede pública de saúde pelo atendimento dos clientes dos planos privados.

Essa questão está aí desde 1995, no início da gestão tucana, e é lei desde 1998.

O fracasso prosseguiu durante os oito anos petistas. Segundo o Tribunal de Contas, entre 2003 e 2007 a Viúva deixou de coletar pelo menos R$ 2,6 bilhões das operadoras de planos de saúde cujos clientes são atendidos na rede pública. A conta pode ter chegado a R$ 5 bilhões.

O governo entendeu que, se um cidadão paga um plano privado, a operadora ganha dinheiro bancando custos de sua saúde.

Caso um cliente do melhor plano do país sofra um grave traumatismo craniano num acidente de automóvel, deve ser levado para a emergência de um pronto-socorro público. (Se for para o melhor hospital privado da cidade, arrisca morrer antes da chegada da equipe de neurocirurgia, pois só há esse plantão em alguns pontos na rede do SUS.)

A vida desse paciente será decidida nas primeiras 24 horas, a um custo de pelo menos R$ 20 mil. Noutro exemplo, um cidadão precisa fazer hemodiálise, vai para a rede pública e, novamente, nada de reembolso.
As operadoras surram a Viúva há 12 anos. Marcando em cima no Congresso, na nobiliarquia médica e na Agência Nacional de Saúde Complementar, desossaram todas as iniciativas dos governos. Quatro mil cobranças estão travadas na Justiça. Teatralmente, o ministro José Gomes Temporão enganou quem lhe dava crédito, inaugurando um novo sistema de cobrança que simplesmente não existia.

A ANSS tem agora cerca de 200 funcionários trabalhando na cobrança do ressarcimento. Estimando-se em R$ 4.000 o salário de cada um, custarão R$ 10 milhões anuais. Em 2008, no auge da ruína, a agência coletou R$ 2,6 milhões.

Dilma e Serra podem responder: noves fora platitudes, o que tenho a propor? Recomeçar do zero, mobilizando a opinião pública, como fez o companheiro Obama, pode ser uma boa ideia.

RECORDAR É VIVER

O poderoso banco de investimentos Goldman Sachs está lutando bravamente para entrar na engenharia financeira da capitalização da Petrobras. Dos grandes, é o único que está fora do negócio.

Deveria ser chamado a participar, desde que seu principal executivo, o doutor Lloyd Blankfein, peça desculpas públicas por uma molecagem e por um mau conselho que seu banco deu aos brasileiros.

A molecagem: No início da campanha presidencial de 2002, quando o dólar começou a subir, o Goldman Sachs criou o Lulômetro. Era uma elegante equação onde cada interessado podia prever o preço do dólar depois da eleição, mudando as variáveis de acordo com suas expectativas políticas. Num resultado otimista, a vitória de Lula levaria a moeda americana de R$ 2,70 para R$ 3,04. Caso José Serra fosse eleito, ela cairia para R$ 2,52. Terrorismo eleitoral, do bom.

O mau conselho: Em janeiro de 1999, quando o governo de Fernando Henrique Cardoso estava afogado numa crise cambial, o Goldman Sachs recomendou uma "medida de grande impacto", a privatização da Petrobras, da Caixa Econômica e do Banco do Brasil.

Paulo Leme, diretor de mercados emergentes do banco, acreditava que o bota-fora aumentaria a credibilidade do país, e a Petrobras renderia até US$ 60 bilhões. O valor de mercado da empresa estava em US$ 15,4 bilhões. Hoje está em US$ 165 bilhões. Leme era um queridinho da ekipekonômica tucana, que desejava colocá-lo numa diretoria do Banco Central. Foi abatido em voo pelo então ministro José Serra.

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