18
de dezembro de 2012 | N° 17287
DAVID
COIMBRA
Parabéns, prefeito
Pessoas
que erram muito têm a obrigação de aprender algo: o exercício da tolerância. Tolerância
consigo mesmas, digo. Sei, porque é o meu caso. Vivo errando. Não estou sendo
modesto; estou sendo sincero. Tenho cá completa consciência das minhas
pusilanimidades e infâmias, mas não vou ficar falando nelas, porque já tem
muita gente por aí apontando meus erros e não serei eu a lhes dar ainda mais
material para me criticar, sobretudo porque essas seriam as críticas certas.
O
importante é que saiba dos meus erros e, em geral, os perdoe. Volta e meia digo
para mim mesmo: “Calma, rapaz, você é um cara legal. O que podia fazer naquela
circunstância?
Qualquer
um erraria como você errou. Nada de punições. Se você desculpa os erros dos
outros, por que não se desculpar? Não é isso? Isso mesmo. Então, vamos em
frente”. Ser condescendente é um alívio, principalmente quando você é o
beneficiado com sua própria condescendência. Vamos pegar um exemplo: as tentações.
É muito fácil resistir às tentações quando você não é tentado.
Você
fica criticando os políticos corruptos. Certo. Agora pergunto: alguém já lhe
ofereceu um milhão para que você cedesse aqui ou ali? Não? Então, como você sabe
que é incorruptível? Talvez você seja um corrupto em estado latente. Talvez você
seja o pior tipo: você quer vender, mas ninguém quer comprar.
Não
quero dizer, com isso, que você deva ser complacente com quem desvia dinheiro público
ou quejandos, mas talvez seja o caso de reconhecer que existem nuances no
comportamento do gestor público. É possível que, em certos casos, o erro não
seja percebido pelo olho do administrador.
Creio
ter sido o que ocorreu no episódio das 462 criancinhas que iam dançar no Araújo
Vianna e que tiveram sua apresentação cancelada pela prefeitura por falta de
previsão orçamentária. O prefeito Fortunati não sabia da dimensão da coisa. Ao
ser informado, determinou a correção do erro. Em 24 horas, tudo foi arranjado
e, no domingo passado, as crianças dançaram, felizes, e abraçaram o prefeito. Foi
um gesto sensível. Aplausos para ele.
Eu
e meu entorno
E os
administradores do Grêmio, eles erraram ao dispensar Cássio, Alessandro, Fábio
Santos, Douglas e até mesmo Tite, todos eles flamantes campeões do mundo com o
Corinthians? Hoje, há muitos oportunistas tentando identificar que dirigentes
promoveram essas dispensas, acusando-os de ter errado. Bobagem. As circunstâncias
são diferentes. Vou tomar o Douglas como exemplo. No Grêmio, ele vivia a
repetir:
– Eu
só jogo com a bola no pé.
No
Corinthians, ele diz:
– Eu
também tenho que ajudar, também tenho que marcar.
Esse
Douglas serviria ao Grêmio, aqueloutro não. O Grêmio não mudou. Douglas, sim. Porque
mudaram as circunstâncias. O homem é o homem e as suas circunstâncias, eu sou
eu e o meu entorno, como filosofava Ortega y Gasset.
Citar
Sant’Ana
La
Fontaine era distraído como o Sant’Ana. Você sabe, La Fontaine foi o grande
fabulista do século 17, o homem que escreveu a Formiga e a Cigarra, o Coelho e
a Tartaruga e outros contos com animais como personagens. Bem. Uma vez, ele foi
ao enterro de um amigo com quem estava habituado a jantar periodicamente,
sempre no mesmo dia do mês. Transcorrido certo tempo, La Fontaine simplesmente
se esqueceu do passamento, se enfarpelou todo e foi para a casa do falecido,
pronto para passar uma noite agradável com ele. O criado da casa, ao abrir a
porta, se espantou e disse, cheio de reticências constrangidas:
– Mas...
senhor... Ele está no cemitério já há 15 dias... O senhor sabe disso...
Ao
que La Fontaine saiu-se com essa:
– Sei.
Mas não sabia que ele ia demorar tanto por lá.
La
Fontaine também era modesto, como não é o Sant’Ana. Sua modéstia era tamanha,
que um escritor francês seu contemporâneo e rival, Fontenelle, um dia resmungou:
– Esse
La Fontaine é tão imbecil que acha que existiram outros fabulistas melhores do
que ele!
Por
que faço essa comparação entre La Fontaine e Sant’Ana? Para dizer que não passa
de fábula isso que o Sant’Ana reclama, de jamais ser citado por outros
colunistas. Já o citei várias em várias oportunidades e, agora, num único
texto, o fiz quatro vezes. Cinco com o título. Seis agora: Sant’Ana. Pode parar
de se queixar, Sant’Ana (sete). Espero que esteja satisfeito, Sant’Ana (oito!).
Leia
o blog do David em www.zerohora.com
A
coluna do David é publicada às terças-feiras
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