24/12/2012
e 25/12/2012 | N° 17293
CELSO
GUTFREIND - (interino)
O Natal de Davi e
Golias
Eu
fui a uma banca de TCC. Qual a importância disso?
Trabalhos
de conclusão existem no mundo acadêmico do mundo inteiro. Em todos os cursos,
da graduação ao pós. São eventos meio fechados, que interessam a seus
protagonistas e suas famílias, quando muito. Alguns rendem frutos à comunidade,
mas a colheita costuma ser feita bem depois.
Eu
não era protagonista e nem da família. Poderia alegar que o assunto escolhido é
original: a utilização terapêutica dos contos. Balela! Desde a noite dos
tempos, os contos têm uma função terapêutica. Era uma vez e será todos os dias.
Quem conta e ouve se sente melhor.
Mas
tudo é história, e as personagens principais são as pessoas. Gente é sempre
importante e não falta a esta trama. Cleonice, a autora do trabalho, é filha de
agricultores. Desde pequena, precisou ajudar os pais na plantação de milho. No
verão, ficava atrás de um arbusto para se esconder do sol. Os cães a protegiam
de perigos como cobras e aranhas. A seca era farta, a terra era pouca e se
acabou. A família foi morar na vila do arrabalde, onde a Cleonice passou a
infância e permanece até hoje. Ela comeu o pão que o diabo amassou e, algumas
vezes, não se alimentou direito. Dias antes da formatura, escapou por pouco de
uma bala perdida. Tinha ido a um bar para assistir pela TV à inauguração da
Arena.
Mas
nunca deixou de encontrar carinho e educação. Não pôde ir a Disney, como gostaria,
mas foi à escola. Frequentou o ensino público, leu material emprestado e livros
da biblioteca. Eu não soube mais da sua vida, pois fui convidado para conhecer
o seu trabalho. Ele é maravilhoso. Ela criou um grupo de contação de histórias
numa creche da periferia. Trabalhou com crianças de famílias tão carentes
quanto a comunidade em que mora.
A
Cleonice falou do Paulo, um menino de seis anos. Ele não sabia quem era o seu
pai e nem queria ouvir contos, mas ela o convidou para desenhar. Ele desenhou
uma biblioteca fechada por um cadeado maciço. A Cleonice não se mixou e traçou
uma chave colorida. No desenho, eles abriram a porta e, na realidade, o Paulo
quis ouvir O Pequeno Polegar. Depois do encontro, ele sente uma grande alegria
e quer saber quem é o seu pai.
Eu
sei que os pais da Cleonice esbanjaram afeto a vida inteira. Não tiro do nada
as minhas conclusões. Provei as bolachinhas que a mãe deu para a filha, com chá
de bergamota, e senti um gosto de amor. Imaginei a riqueza dos sentimentos como
um Davi, enfrentando o Golias da pobreza para fazer de uma vida específica um
conto tradicional, sem final triste. Claro que necessitam de aliados, mas é um
começo feliz, e os começos gostam de ecoar para sempre.
Infelizmente,
a Cleonice ainda é original. Felizmente, já não é a única.
Um comentário:
Eu conheço esta querida Cleonice! ela é tudo isso o que disseste e mais ainda ela dá oportunidade a escritores jovens que precisam de portas abertas para serem conhecidos.Parabéns à ti, por escrever esta crônica que me fez ir as lágrimas, e a ela por ter superado tudo e dado uma grande alegria a sua amada família.
grande abraço
ana maria pessoa de brum
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