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quarta-feira, 2 de março de 2011
02 de março de 2011 | N° 16627
MARTHA MEDEIROS
Bicicletas levadas a sério
Avenida Ipiranga, 8h da manhã de sexta-feira passada. Tirei um fino de dois ciclistas, entre os muitos que pedalavam prensados entre os carros estacionados à sua direita e os carros em movimento do lado esquerdo. Pensei: é um milagre que não ocorram mais acidentes envolvendo esse pessoal. Nem imaginava que, à noite, aconteceria aquele espantoso atropelamento em massa.
Não sei o que mais precisa acontecer para Porto Alegre se conscientizar da importância de se determinar um espaço para uso exclusivo de bicicletas, esse meio de transporte revolucionário. Elas são baratas, não poluem o ar, não gastam combustível, são fáceis de estacionar e ainda colaboram para o nosso condicionamento físico. Por que são reverenciadas na Europa e não aqui?
As cidades europeias nasceram séculos antes de Henry Ford. Os primeiros prédios foram construídos sem garagem, lógico, e não vieram outros prédios, pois a Europa tem esta mania estranha de preservar seu patrimônio, modernizando-se por dentro, mas mantendo a fachada de origem, o que faz dela o continente mais belo do planeta.
Até nos vilarejos medievais há ciclovias e códigos de trânsito para ciclistas. E o conceito de status social difere do nosso. Os adolescentes fazem 18 anos, depois 28, e então 38, e, se não tiverem um carro, continuam sendo cidadãos respeitáveis e conseguem inclusive arranjar namorada.
Já o Brasil, a exemplo dos Estados Unidos, cultua o automóvel a ponto de ser prisioneiro dele. Somos estimulados a nos endividar para ter um carro do ano, como se isso fosse dizer quem somos. De certa maneira, diz. Diz que somos vítimas de um comportamento padrão que vê com desconfiança hábitos alternativos e que pouco luta por um transporte público mais seguro e eficiente, o que nos tornaria menos dependentes das quatro rodas e suas trações.
No Rio Grande do Sul, há 5 milhões de veículos transitando pelas ruas e estradas. Por um lado, a notícia é boa, pois comprova a elevação do nosso poder aquisitivo, mas por outro é preocupante, já que não há condições de acomodar toda essa frota nas grandes cidades, principalmente na capital, onde o trânsito flui de forma lenta, mal organizada e despreparada para o convívio com veículos menos potentes.
Que a estupidez que aconteceu na última sexta-feira sirva para duas coisas. Primeira: alertar para o perigo do superaquecimento não só ambiental, mas mental. Pessoas destemperadas, que não conseguem se controlar, devem ser afastadas dos volantes (se alguns manifestantes perderam a cabeça com o motorista durante a discussão, vale pra eles também – ninguém tem que dar socos em para-brisas).
Segunda: que se providencie a repintura das sinalizações no asfalto das ciclovias já existentes, e que sejam criados vários outros quilômetros de pistas exclusivas para bikes. Não é só para passear nos finais de semana que se usa bicicleta: elas levam estudantes e trabalhadores aos seus destinos todos os dias. É uma questão séria de gestão urbana.
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