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quinta-feira, 31 de março de 2011
31 de março de 2011 | N° 16656
LETICIA WIERZCHOWSKI
Dirigindo em Porto Alegre
Durante a semana do aniversário de Porto Alegre, Zero Hora publicou uma série de perfis de estrangeiros radicados na cidade. Todos se diziam muito felizes com a capital gaúcha. Um povo hospitaleiro, uma cidade gentil. Orgulhosos, lemos vários dias sobre a vida dessas pessoas que vieram de longe e abraçaram a nossa cidade como seu novo lar.
Num desses depoimentos, porém, um pequeno detalhe me chamou a atenção: uma jovem espanhola, que veio para Porto Alegre com o marido alemão, e aqui teve seus filhos gêmeos, comentou de passagem “que os porto-alegrenses mudam quando estão na direção”. Mudam mesmo, e mudam – de maneira assustadora – para muito pior.
Todos os dias, quando saio de casa, guiando meu carro ou a pé pelo bairro, fico impressionada com a atitude absolutamente bélica dos nossos motoristas.
Dentro do carro, protegidos por vidros escuros e amparados na própria e eterna pressa, gente cordata e civilizada passa a desrespeitar as mais básicas regras de trânsito. Faixa de segurança? Piada. Já vi muito pedestre quase perder o braço ao executar aquele gesto que a prefeitura tentou divulgar numa campanha há pouco tempo.
Na escola do meu filho, uma das mais conceituadas da cidade, os pais estacionam na própria faixa de segurança – impossibilitando a travessia de outros alunos da instituição – para que as suas crianças desçam do carro com mais conforto.
Na rua onde vivo, os próprios moradores trafegam no sentido proibido (a rua, pequena e sinuosa, tem sentido único), de modo a chegarem mais rápido às suas garagens.
Buzinaços, infrações de toda a ordem e violência verbal enfeitam o trânsito cotidiano da nossa querida Porto Alegre – nós, grandes consumidores de literatura segundo as pesquisas, um povo culto, organizado e politizado.
Nós, descendentes daqueles alemães, judeus, italianos, poloneses e portugueses que aqui, às margens deste estuário que gostamos de chamar carinhosamente de rio, fincaram pé e ergueram uma metrópole.
Somos orgulhosos, gentis e cooperativos. Mas, com a marcha do carro engatada, somos capazes de toda a sorte de grosserias e de abusos – e vamos seguindo pelos dias, ensinando aos nossos filhos uma maneira inequívoca de vilipendiar o espaço do qual tanto nos orgulhamos por aí afora.
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