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sábado, 19 de março de 2011
20 de março de 2011 | N° 16645
PAULO SANT’ANA | ALEXANDRE BACH - Interino
Srta. Sasaki
Hiroshima, o tocante livro de John Hersey, serve de alento para todos nós que sofremos à distância com os acontecimentos dos últimos dias no Japão. Não é todo dia que um país encara um terremoto, um tsunami gigantesco e um acidente nuclear que até esse momento não está totalmente dimensionado, embora já se saiba que será uma tragédia. Um na sequência do outro, sem dar folga, destruindo prédios, dizimando vidas.
Mas se existe um povo no mundo que consegue tirar forças sabe-se lá de onde e virar o jogo, certamente esse povo é o japonês. Pois o relato de Hersey é o relato dessa bravura nipônica. É a história de um grupo de sobreviventes de um ataque nuclear que enfrentou a morte como nenhum outro povo em toda a nossa história. E a venceu.
Olhando as imagens recentes do pouco que sobrou das cidades e vilarejos totalmente destruídos na costa japonesa, eu fico a pensar como essas pessoas estão encarando o presente. E o que planejam para o futuro. Tento imaginar um cotidiano sem as coisas mais básicas que fazem parte da nova vida.
Como estão educando seus filhos, se não há escolas? Onde estão comprando frutas e verduras, se o armazém da esquina não passa de um monte de escombros? Como curtem suas memórias, se perderam fotos e objetos juntados um a um para servir de testemunhos de uma vida? Como amam, se pais, filhos e amigos foram levados para sempre pela força das águas? Como pranteiam seus mortos, se nem corpos existem?
De onde tiram forças para viver e enxergar um futuro?
Se vivo fosse, teria feito essas mesmas perguntas no dia 7 de agosto de 1945, o dia seguinte ao ataque nuclear à cidade de Hiroshima, que deixou cerca de 140 mil mortos. É sem sombra de dúvidas o mais sangrento episódio da Segunda Guerra Mundial. Talvez de todas as guerras. As respostas eu comecei a encontrar ao conhecer a obra de Hersey, nascido chinês e criado nos Estados Unidos. Jornalista, faleceu em 1993, mas deixou para todos nós essa obra de leitura obrigatória.
Uma das respostas quem me deu foi a srta. Sasaki, então funcionária de uma fundição.
“A srta. Sasaki ficou dois dias e duas noites sob o telheiro improvisado, com seus lastimáveis companheiros. Sua única distração consistia em observar os homens que iam até os abrigos para remover os cadáveres. Sua perna quebrada estava sem cor, inchada e pútrida. Durante esse tempo, não ingeriu alimento nem água. No terceiro dia, uns amigos que a julgavam morta foram procurar seu corpo e a encontraram”, relata Hersey.
Um horror? Pois ficou ainda pior nos próximos dias da hibakusha, como os japoneses chamam os sobreviventes do ataque nuclear. Então, chegamos ao final da história de Hersey. Em 1980, a srta. Sasaki foi homenageada, pois completava 25 anos como freira. Na festa, deixou um recado que soa atual como nunca.
“Não me deterei no passado. Quando sobrevivi à bomba A, foi como se tivesse ganho uma vida sobressalente. Mas prefiro não olhar para trás. Vou continuar olhando para frente.”
De onde tiram forças para viver e enxergar um futuro? Da alma de gente como a srta.
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