sexta-feira, 18 de março de 2011



Naela Ochoa Piazzeta* - ARTIGOS
18 de março de 2011 | N° 16643


“Eu cei esqrever"

Sala de aula, cadernos abertos sobre a mesa e a mão infantil a escrever o ditado. “Eu cei esqrever”, na folha pautada. É a chamada para um programa sobre a educação no Brasil, a ser transmitido pela Globo News. A pungência da frase serve de título a este artigo.

Nada de novo sobre o tema. Há décadas se sabe que a educação formal, aquela que abrange a escolaridade básica em nosso país, é uma das piores do mundo. O ensino superior segue igual caminho. Segundo a Times Higher Education, nenhuma universidade brasileira foi incluída no ranking das cem melhores.

Todavia, apesar da repetição, o tema se presta a várias abordagens. Uma delas, e sobre a qual me debruço, diz com a evolução de um povo a partir do amplo espectro do conhecimento. Através da aquisição de ferramentas intelectuais, aprendemos a pensar-nos como indivíduos e a entender o contexto cultural no qual estamos inseridos.

A família é a emissora do primeiro discurso sobre valores éticos e morais, mas a compreensão e apreensão do que é lido reforça o que é legado pelo berço. Ler mal traz atrelada a incapacidade de escrever corretamente.

Educação de qualidade é um bem raro no Brasil, a que poucos têm acesso. Se vingar a nova diretriz do Ministério da Educação (MEC), a repetência será abolida das escolas públicas e particulares até o 3º ano do ensino fundamental, pondo fim à cobrança por desempenho e ao sistema de mérito. Países que aplicaram modelo semelhante ao proposto só obtiveram êxito à custa de rigorosa vigilância e mediante condições reais para a criança avançar.

A exigência de mérito escolar não pode ser vista como óbice ao desenvolvimento intelectual dos indivíduos, mas sim como poderoso estímulo para a superação de obstáculos e preparação para a vida profissional, cada vez mais competitiva e seletiva.

Ao contrário do governo brasileiro, que durante oito anos, com o presidente Lula, e agora, até prova em contrário, com sua sucessora, Dilma Rousseff, adotou o paternalismo como solução básica para a redução das desigualdades, o mercado exige preparo, conhecimentos cada vez mais aprofundados e, inegavelmente, mérito pessoal daquele que oferece seu trabalho.

Mas pior do que está fica, basta lembrar de Tiririca. Eleito deputado federal com o maior número de votos nominais dado a um candidato, ainda foi escolhido membro da Comissão de Educação e Cultura.

É um acinte, um deboche. O homem acusado de analfabeto e submetido a testes para aferição de sua capacidade de ler e escrever, e nos quais passou de raspão, apresentará as coordenadas para a nova educação do país.

Nesse passo, “eu cei esqrever” será o efetivamente correto.

*Desembargadora do TJRS

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