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sábado, 12 de março de 2011
12 de março de 2011 | N° 16637
NILSON SOUZA
Duas rodas
No meu tempo de garoto, as bicicletas tinham duas características básicas: ou eram torpedo ou catraca. Torpedo, não sei se ainda é assim hoje, é aquela que tem freio contra pedal. Basta a gente empurrar o pedal para trás que a roda de trás bloqueia. Era o modelo ideal para fazer cavalo-de-pau em pista de terra.
A gente embalava e, no ponto escolhido, largava todo o peso do corpo no pedal, girando levemente a roda da frente. Os mais habilidosos nem colocavam o pé no chão, saíam do meio da poeira pedalando. Modéstia à parte, cansei de fazer isso.
Já as chamadas catracas tinham freio no guidom, o da esquerda para a roda da frente, o da direita para a roda de trás. Também não sei se ainda é assim, pois agora as bikes têm várias marchas, algumas são tão sofisticadas que o condutor pedala deitado. E a garotada faz cada coisa em cima de duas rodas que os circos só podiam mesmo ir à falência. Antigamente andar com a roda da frente no ar já era uma proeza. Agora tem menino dando mortal triplo sem descer do selim.
Por tudo isso – e também por absoluta incompatibilidade com o nosso trânsito – doei a última bicicleta que tive para o entregador de jornais, desejando que o homem fizesse bom uso do equipamento na sua tarefa de todas as madrugadas. Não durou uma semana nas suas mãos: ele encostou a bicicleta num poste para fazer a sua entrega e, quando voltou, ela já estava longe.
Os ladrões de bicicleta também se sofisticaram. Em tempos pretéritos, o máximo que eles faziam era raspar a pintura para evitar que ela fosse reconhecida pelo dono. Agora, me contou um especialista, trocam o quadro e as rodas, colocam acessórios coloridos, mudam tanto que ninguém mais consegue identificar.
Nunca tive esses equipamentos modernos que hoje fazem do ciclista quase um jogador de futebol americano: luvas, capacete, sapatilhas especiais, camisas antitranspiração e calças colantes. O máximo que contei como equipamento, na juventude, foi uma presilha de lata, que evitava que a calça comprida fosse mordida pela correia. Na maioria das vezes, porém, apenas colocava a calça dentro da meia.
Apesar de tanto amadorismo, fui um ciclista assíduo. Na época em que prestei serviço militar na base aérea de Canoas, saía pedalando da zona norte da Capital, atravessava um pedaço de Cachoeirinha e entrava, mediante permissão especial do comando, pelo portão dos fundos da área militar.
Poupava a passagem do ônibus, ganhava músculos nas pernas e ainda chegava em tempo de pegar o café da manhã, que era uma das melhores refeições do dia.
Mas o melhor deste brinquedo/transporte que me traz tantas boas recordações é que ele só obedece a quem aprende a inesquecível lição do equilíbrio. É o que parece estar faltando nesta batalha cada vez mais radical entre os condutores de bicicletas e de automóveis em nossa cidade.
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