quarta-feira, 30 de março de 2011



30 de março de 2011 | N° 16655
DAVID COIMBRA


Os índios que matavam tubarão com as mãos

Os goitacazes foram talvez os índios mais ferozes do Brasil. Eram também mais altos, mais claros e mais fortes do que os outros índios brasileiros. Até as tribos inimigas os admiravam por nadarem como uns Phelps e correrem como uns Bolts. Para deslizar n’água com maior facilidade, raspavam o alto da cabeça, como já fez um dia o Cesar Cielo com bom resultado. Eram tão velozes sobre suas duas pernas que sobre elas caçavam veados, que, em geral, têm o dobro de pernas.

Li, acho que em algum dos livros do Peninha, que já li todos os livros do Peninha, aquele gaiato sibarita, pois tenho quase certeza de num deles ter lido que os goitacazes matavam tubarão à unha. Nadavam até a segunda arrebentação e, quando o tubarão os atacava pretendendo lhes arrancar um naco à dentada, eles atravessavam um pedaço de pau verticalmente em sua boca.

Assim, o bicho não conseguia mover o maxilar e se tornava inofensivo, já que tubarão não tem mão para socar nem pé para chutar. Isso feito, os intrépidos goitacazes cometiam algo que nem o Indiana Jones ajudado pelo MacGyver seria capaz de cometer: enfiavam o braço goela adentro do tubarão e lhe arrancavam as entranhas, matando-o eviscerado.

Os goitacazes usavam enormes arcos da altura de um Wianey Carlet, que não é muito grande para um comentarista, mas é para um arco. Com eles, disparavam flechas do tamanho de lanças que atravessavam as armaduras e os peitos dos portugueses. Quando os homens brancos achavam que haviam encurralado um guerreiro goitacaz, ele se atirava numa das lagoas ou pântanos das imediações, saía ondulando feito um muçum e aí ninguém mais o alcançava.

Como no braço estava sendo difícil batê-los, os portugueses usaram a cabeça. Espalharam roupas contaminadas com varíola pelos caminhos trilhados pelos goitacazes. Os índios colhiam-nas do chão e as vestiam, achando-se muito elegantes. Voltavam para a tribo exibidos com o traje novo, sem imaginar que estavam servindo de armas numa guerra química da qual eles mesmos seriam as vítimas. Em pouco tempo, foram todos dizimados. Eram mais de 12 mil, não sobrou nenhum para brigar com os tubarões do século 21.

Hoje, Goytacaz é tão-somente um time ruim da cidade de Campos, no Rio de Janeiro. O Goytacaz do futebol nunca disputou uma Libertadores, nunca ganhou um campeonato carioca. E é um goitacaz.

Conclusão: não é de bom augúrio a faixa verde que os designers atravessaram no peito da camisa da Seleção. Alegaram tratar-se de uma referência aos índios brasileiros, que faziam uma pintura semelhante de orelha a orelha, ao sair para a guerra. Ora, os índios brasileiros foram derrotados em TODAS as guerras.

Nunca houve, na história dos índios brasileiros, uma batalha como a de Little Bighorn, em que a Sétima Cavalaria do general Custer foi massacrada pelos Sioux e Cheyennes de Touro Sentado. Até porque nunca houve uma guerra formal do governo contra os índios, exceto casos raros, como o das Missões, e ainda assim os alvos eram mais os jesuítas do que os guaranis. Ninguém no governo brasileiro declarou, como o general americano Sheridan:

– Índio bom é índio morto.

Para o Goytacaz, pobre Goytacaz, não lhe valeu o nome daquela gente bravia que matava portugueses a flechaço e tubarão com as mãos nuas. Imagine, então, escorar-se nos outros índios brasileiros, menos belicosos e mais amistosos. Não...

No quesito guerra, os índios brasileiros foram uns fracassados. O que, aliás, não é ruim. O índio brasileiro, pacífico, alegre, amante da música e das índias nuas, esse sabia viver. Antes ser um ticuna de calção Adidas e telefone celular do que um hunkpapa extinto.

Se a Seleção Brasileira precisar de um exemplo agressivo de sucesso, do mais faiscante exemplo de entidade vitoriosa, que humilha seus adversários e os amassa no mundo inteiro, não há outro melhor do que... a Seleção Brasileira. Não há nada que seja melhor de briga, no Brasil, do que a Seleção Brasileira.

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