terça-feira, 29 de março de 2011



29 de março de 2011 | N° 16654AlertaVoltar para a edição de hoje
DIANA CORSO | DIANA CORSO (interina)

Amadores do sexo

Perdoem-me o trocadilho infame, mas em poucas áreas somos mais amadores do que no sexo. Por isso, as palavras de uma expert, impactam. Raquel Pacheco, retratada no filme Bruna Surfistinha, assistido por mais de 2 milhões de espectadores, foi uma garota de programa. Sua história, narrada originalmente no livro O Doce Veneno do Escorpião, serviu como elo entre os profissionais do sexo e a vasta legião de adultos, praticantes amadores.

Moça de classe média, filha adotiva, acabou rompendo com a família para abrigar-se na identidade de prostituta. Os instrumentos de sua educação revelaram-se na escrita, num blog, batizado com seu nome de guerra, onde contava em detalhes seu cotidiano, incluindo sua avaliação sobre o desempenho dos clientes. Como profissional, Bruna era apenas mais uma, foi ao escrever sobre o que todos desejam saber que Raquel encontrou a celebridade.

Frente ao sexo nos sentimos da mesma forma que em relação aos computadores: neles sempre há muito mais funções e possibilidades que não sabemos explorar. Mesmo aos mais ousados resta a ideia de estar subutilizando sua “máquina” e hoje não perdoamos a vida que não entregue todo o gozo que nos devia.

Não faltam sexólogos para instruir sobre os caminhos que o prazer poderia trilhar, e as palavras destes sempre encontram bom público, tanto maior quanto for a sinceridade dos autores. É justamente no item da sinceridade que Bruna derrota seus concorrentes teóricos, pois suas experiências são reais.

Gostamos de acreditar que as prostitutas não são de fato mercenárias, porque nos identificamos com elas. Afinal, todos julgam ser como elas: um de dia e outro de noite. O gozo fingido que elas praticam também não nos é estranho, se insinua nas ocasiões em que, no casal, um se consagra ao prazer do outro, numa cena que bajula seu desempenho ou dotes.

Além disso, detestamos pensar que a relação sexual possa ser apenas um trabalho, uma tarefa, e não a expressão máxima do que se é, a verdade última do amor e do valor de cada um. Prima-dona do nosso imaginário, a prostituta tem por clientela todos os que fantasiam com ela e através dela. Ela encarna a inflação de sentidos que em vão esperamos do sexo.

O texto de Raquel não tem excelência literária, mas estende uma ponte entre a mulher comum e a prostituta. Em suas palavras: “As mulheres têm de ser damas para a sociedade e putas na cama, sempre disse isso. Mas também sempre digo que temos que ser putas mulheres e mulheres putas.

Muitas mulheres perdem seus homens não porque não os satisfazem sexualmente, mas porque não são ‘putas mulheres’”. Se multidões se interessaram pela sua história e pelo seu texto, é graças ao prestígio que o gozo sexual tem entre nossos valores. Tentamos aprender com sua experiência, afinal, quem não gostaria de colocar no currículo que no sexo é fluente e diplomado?

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