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sábado, 13 de outubro de 2007
Ponto de vista: Claudio de Moura Castro
Falsos estágios?
"A legislação brasileira já conseguiu varrer do mapa o milenar sistema de aprendizagem. É perfeitamente esperado que agora se
dedique a destruir os estágios"
Muito se fala e se escreve sobre os estágios. Alguns decantam incansavelmente suas virtudes. Mas, também, denunciam-se os estágios como forma disfarçada de contratação de mão-de-obra barata.
Por isso, tramitam novas regulamentações, visando a coibir tais abusos, estabelecendo limites às tarefas pertinentes aos estagiários, bem como reduzindo sua jornada de trabalho e proibindo o trabalho produtivo.
Aqueles que acusam o estágio de ser uma forma disfarçada de emprego a baixo custo estão cobertos de razão. Do milhão de estágios, boa parte é exatamente isso.
Contudo, esse é um de seus méritos. Grande número de jovens tira xerox, leva papéis, executa os trabalhos mais simples e desinteressantes dos escritórios. No fundo, não são estágios legítimos. São empregos simplórios reservados para estudantes.
Mas é assim que os jovens financiam os estudos. Sem esses falsos estágios, muitos deles estariam impedidos de estudar, pois não disporiam de recursos para pagar a mensalidade da escola.
Em outras palavras: diante de uma legislação trabalhista que desencoraja o emprego, o estágio é uma saída, ainda que seja pela porta dos fundos.
É bom para a empresa, pois é mão-de-obra mais barata. Pesquisas mostram que os (falsos) estagiários também gostam, o trabalho permite-lhes muito aprendizado útil. É infinitamente melhor do que o desemprego.
As companhias têm diferentes razões para acolher estagiários. Essa pode ser a principal estratégia para selecionar seus futuros funcionários de primeira linha. Nessa lógica, atraem os melhores candidatos e investem neles.
Seu número não depende de leis protegendo os estagiários, mas das políticas de contratação vigentes na empresa e do dinamismo da economia. Bem sabemos que há pouca criatividade e inadequado aproveitamento dos estagiários. Contudo, as leis são impotentes para mudar isso.
Ilustração Atomica Studio
Outra razão para receber estagiários é o fato de obter trabalho temporário ou serviços adicionais a baixo custo. Não são reais estágios, mas empregos simples para estudantes, garantidos por uma reserva de mercado. Enquanto for mais barato, contrata-se um estagiário para tirar xerox.
Se a lei não deixa o estagiário produzir "de verdade", limita as horas de presença no trabalho e cria outros constrangimentos, a empresa preferirá contratar office-boys. As restrições em discussão poderão ter um efeito devastador sobre os falsos estágios, por uma questão elementar de racionalidade econômica.
Muitos dirão, ora vivas, taparemos um buraco na lei. Para as empresas, a perda será limitada. Mas acontece que são ínfimas as chances que têm esses alunos modestos de arranjar verdadeiros estágios, competindo com colegas academicamente mais fortes.
Mas o prejuízo atinge também os reais estágios, oferecidos pelas grandes empresas. Os autores da proposta de lei, pelo que se depreende, nunca entraram em uma empresa e jamais entenderam a lógica do "aprender fazendo", mais velha e tão respeitável quanto a escola.
Pelas novas regras, um aluno de marcenaria deve aprender a serrar em tábuas que serão jogadas fora. Contudo, há muitos conhecimentos que só podem ser adquiridos pelo exercício da ocupação. Um aprendiz nas tarefas gerenciais ou administrativas não pode decidir e jogar fora a decisão.
Aprende-se executando, "de verdade", tarefas mais simples ou ajudando colegas mais experientes. Se os estagiários não podem produzir, não podem aprender. Portanto, é tudo "de fingidinho", empobrecendo o processo de aprendizado dos reais estagiários.
Os clássicos beneficiários da atual flexibilidade da lei são os mais pobres. Como tentar consertar a CLT é encrenca certa, deixar como está seria o mal menor. De fato, os estágios financiam a educação de 28% dos universitários (em SP).
São mais alunos do que no ProUni e no Fies. Quantos estágios desaparecerão com a nova lei? Mas há lógica nessa burrice. A legislação brasileira já conseguiu varrer do mapa o milenar sistema de aprendizagem.
É perfeitamente esperado que agora se dedique a destruir os estágios, outra forma de aprender fazendo.
Claudio de Moura Castro é economista
Claudio&Moura&Castro@attglobal.net
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