Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 13 de outubro de 2007
14 de outubro de 2007
N° 15392 - David Coimbra
O olho clínico do recruta Dutra
Perto do cabo Mathias, o Sandro Goiano seria a Cinderela. O cabo Mathias era grande.
O cabo Mathias era mau. O cabo Mathias era o zagueiro-central do time do quartel, famoso por fraturar tíbias, perônios, mandíbulas, falanges, falanginhas e até mesmo falangetas de centroavantes de todos os tamanhos, cores e religiões - o cabo Mathias não tinha preconceitos na hora de dividir a bola.
Naquela manhã de sábado, o cabo Mathias ia marcar o recruta Dutra.
O recruta Dutra era em tudo oposto ao cabo Mathias. Não que o recruta Dutra fosse pequeno. Não era. Mas para grande não servia. Um magro congênito.
Tinha braços finos, não se entusiasmava com exercícios físicos, não gostava de violência. O recruta Dutra cultivava apenas duas paixões na vida: as mulheres e os gols. Um artilheiro, o recruta Dutra, e um militante do sexo. Vivia a repetir:
- Tenho um olho clínico para o território da grande área e outro para o território do amor.
Natural, portanto, que o recruta Dutra temesse a marcação do cabo Mathias, naquele jogo no quartel. Só que não temia. Ou pelo menos dizia não temer. Durante a semana que antecedeu a partida, o recruta Dutra arrostava:
- Vou ganhar esse joguinho. E vai ser em cima desse cabo. E vai ser barbada.
O cabo Mathias, sabedor das provocações, rosnava que ia matar o recruta Dutra, que ia transformar a cara dele em xis-bacon, que ia fazer com o recruta Dutra o que o sargento Tainha fazia com o recruta Zero.
O duelo transformou o jogo em atração. Todos, dentro e fora do quartel, foram assisti-lo. O sargento Becker, homem de grande ascendência sobre a tropa, foi escalado para apitar.
Na hora do jogo, o próprio sargento decidiu buscar os dois times no vestiário, a fim de evitar que os problemas começassem antes da bola rolar. Mas, no caminho para o campo, aconteceu o que poderia ser considerada a primeira irregularidade.
O recruta Dutra aproximou-se à socapa do cabo Mathias e encaixou-se nele por trás, agarrou-o como se fossem namorados e, empalmando com ambas as mãos os mamilos do cabo, sussurrou-lhe algo ao ouvido. O curioso é que o gesto do recruta não foi ofensivo; foi de carinho. Foi algo intenso.
A surpresa fez o cabo Mathias emudecer por alguns segundos. Antes que se recuperasse do susto, o recruta havia desaparecido no bolo de jogadores e torcedores. O cabo ficou olhando para os lados e gritando:
- Mas o que é isso? O que é isso? Eu mato! Eu mato!
Mas não podia fazer nada. O sargento Becker estava por perto.
Na saída de jogo, o cabo Mathias só encarava o recruta Dutra. Com a bola rolando, procurava-o em campo. O recruta o evitava.
- Covarde! - gania o cabo. - Covarde!
Antes de um escanteio, porém, o recruta se aproximou e, na algaravia da grande área, enfiou as mãos por baixo da camiseta do cabo e lhe bolinou os flancos e novamente lhe murmurou uma frase na ponta do lóbulo da orelha e outra vez a surpresa é que não foi um gesto de agressão. De forma alguma.
Foi uma carícia com infinita meiguice. A reação do cabo foi de perplexidade. Ele fez uf e ficou plantado no solo, imóvel, enquanto o recruta o largava e a bola passava sobre sua cabeça. Foi assim que o recruta marcou o gol. Recuou dois passos e escorou a bola com a cabeça para a rede.
O espanto do cabo era tamanho que ele não atinava em reagir. Não sabia se explodia de raiva pelo assédio do recruta ou se lamentava o gol sofrido. E assim foi durante a partida inteira.
O recruta nunca partia para cima do cabo com a bola nos pés, nunca o confrontava, mas, quando Mathias se distraía, ele se achegava à sorrelfa e lhe pespegava um beijo no pescoço, ciciava-lhe algumas palavras cálidas ou repetia o afago em seus mamilos sensíveis.
O time do recruta ganhou por 1 a 0, e ele saiu de campo ileso e festejado. O cabo não teve ânimo nem para desafiá-lo, depois que a partida terminou. Foi-se embora cabisbaixo, desmoralizado, sem nem tomar banho.
Até porque o sargento Becker mantinha-se vigilante. No churrasco da vitória, todos perguntavam ao recruta como ele tinha alcançado aquela façanha e o que ele dizia para o cabo Mathias durante a partida. E ele repetia, com um meio sorriso:
- Tenho um olho clínico na grande área. E outro no amor.
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