terça-feira, 23 de outubro de 2007



23 de outubro de 2007
N° 15396 - Cláudio Moreno


O sexo frágil

Para Ana, minha mulher

Se os heróis da mitologia fossem hoje recebidos no aeroporto, nenhum deles - nem Hércules, nem Ulisses, nem Aquiles - mereceria mais aplausos que Prometeu, a quem devemos muito mais do que se pensa. Sem ele não teríamos o fogo, que ele foi roubar aos deuses para nos dar de presente, tornando-se, com isso, alvo da cólera divina.

O grande poeta Hesíodo, autor da versão mais famosa do mito, conta que Zeus ficou tão furioso que resolveu punir exemplarmente os envolvidos no roubo.

Para castigar Prometeu, acorrentou-o a um rochedo no Cáucaso e mandou que uma águia viesse devorar-lhe o fígado, que se renovava todos os dia. Para castigar os homens, recorreu ao expediente mais sutil, mas nem por isso menos terrível, de criar a primeira mulher.

Embora Hesíodo descreva isso como uma vingança, o capricho com que Zeus desenhou e executou o projeto da mulher sugerem que o poeta, cego com seus preconceitos, não percebeu o orgulho que o Rei dos Deuses sentia pela obra que estava criando.

Primeiro, ordenou a Hefesto, o artesão divino, que moldasse, na mesma argila usada para o homem, um ser tão belo quanto as deusas, que fosse "igual ao homem, mas diferente":

onde o homem era forte, ela seria fraca; onde o homem era tolo, ela seria sábia; onde o homem era duro, ela seria macia; onde o homem era ousado, ela seria tímida, mas onde o homem tivesse medo, ela teria coragem.

Depois, chamou todos os deuses para ajudá-lo, pedindo-lhes que dotassem a nova criatura com o melhor e o pior de si mesmos. Afrodite deu-lhe graça e beleza, mas também a vaidade; Atena deu-lhe habilidade com as mãos, mas também a curiosidade perigosa; Hermes deu-lhe o dom da persuasão, mas também a ensinou a enganar com as palavras - e assim por diante.

Como se tratava de um presente que todos os deuses faziam ao homem, chamaram-na de Pandora, que, em Grego, significa exatamente "a que tem todas as dádivas".

Com ela nasce o sexo feminino, mais fraco e delicado, de uma fragilidade que contrasta com a ação enérgica e decidida do sexo masculino: o homem caça, faz a guerra, derruba as muralhas de Tróia, derrota os persas e abate o leão de Neméia, enquanto ela canta diante do tear e espera que ele volte para casa.

Dir-se-ia que tudo está em seu lugar e que não há dúvida quanto ao papel de cada um - até que, um dia, ela tem um filho, e toda a falsidade deste quadro vem à tona.

Já no parto o homem fica desconcertado ao ver a força espantosa que sua frágil companheira consegue mobilizar, aceitando a dor e o cansaço num nível que seria insuportável até para o mais rude guerreiro.

Depois, à cabeceira de um filho doente, ele assiste, com respeito e admiração, àquela luta titânica que só as mães conseguem travar, noites e noites a fio, contra o inimigo invisível e traiçoeiro que ronda o berço com suas asas negras - e então, com toda a humildade, ele finalmente compreende qual dos dois é o sexo frágil, e agradece a Zeus pela maravilhosa companheira que recebeu.

Nenhum comentário: