quinta-feira, 18 de outubro de 2007


Clóvis Rossi

"O padre e o "correria"

Imagino que o rapper Ferréz voltará em breve às paginas desta Folha para repetir, sobre o caso da extorsão ao padre Júlio Lancelotti, o que escreveu sobre o Rolex de Luciano Huck. Ferréz terminava assim:

"No final das contas, todos saíram ganhando, o assaltado ficou com o que tinha de mais valioso, que é sua vida, e o correria ficou com o relógio. Não vejo motivo pra reclamação, afinal, num mundo indefensável, até que o rolo foi justo pra ambas as partes".

O extorquido (padre Júlio) ficou com a sua vida, o "correria" ficou com o seu Mitsubishi Pajero, o mundo continua indefensável e, por extensão "o rolo foi justo para ambas as partes", certo?

Errado, dirá o adepto da esdrúxula teoria de que é correto roubar da "elite" e só da "elite". Funcionaria até como distribuição de renda (sei que a teoria é ridícula, mas o ridículo no Brasil tem longa vida e ampla difusão). Mas a sociologia tipo Ferréz justifica a criminalidade a partir das duras condições de vida dos "correrias".

Se é assim, está justificada a extorsão ao padre Júlio. Afinal, o chefe dos chantagistas é um ex-interno da Febem, e todo mundo sabe quão dura é a vida dos internos e dos ex-internos da Febem.

O único "erro", digamos assim, dos chantagistas foi não terem escolhido Luciano Huck ou Ana Maria Braga ou Ivete Sangalo ou outro desses personagens que enriquecem obrigando o "povo" a ver seus programas ou seus shows.

Pena que o "erro" derruba toda a sociologia. Padre Júlio não é rico nem da elite, mas nem por isso deixou de perder o seu Rolex. Sociologia calhorda à parte, vamos aos fatos como eles são, na frase magistral do belíssimo artigo de Alba Zaluar, publicado segunda-feira:

"Defender o roubo como recurso de distribuição de renda revela um enorme desconhecimento das redes e tramas do submundo do crime, onde grassa o capitalismo mais selvagem de que se tem notícia".

Well, Fiquem com os anjinhos

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