sábado, 2 de fevereiro de 2013



02 de fevereiro de 2013 | N° 17331
NILSON SOUZA

TV Senado

Vou confessar a verdade na primeira linha: não gostei do filme Lincoln, multi-indicado para o Oscar. Tudo bem, concordo que Daniel Day-Lewis merece a estatueta de melhor ator, mesmo sem ter visto todos os seus concorrentes. Ele é a própria figura da nota de cinco dólares.

E encarna o ex-presidente de forma tão convincente, que até a dona Mary Todd, se estivesse viva, poderia confundi-lo com o marido original. Sua atuação é exuberante, tanto nos silêncios quanto nos discursos – especialmente quando dá um tapa na mesa para não deixar dúvida de sua determinação em aprovar a emenda da emancipação dos escravos.

No mais, é como assistir à TV Senado. O filme se arrasta numa interminável sucessão de diálogos protagonizados por figuras encapotadas e sombrias. Politicagem pura – e da pior espécie. O mito do presidente heroico, que foi assassinado no exercício do cargo depois de administrar o fim da Guerra da Secessão e de manter o país unido, fica arranhado pelas negociatas mostradas pelo filme.

Não conheço a fundo a história norte-americana, mas aquele Lincoln mostrado no filme, que autorizou a compra de votos de parlamentares e a concessão de empregos e favores para os cooptados, seria facilmente condenado pelo ministro Joaquim Barbosa. No mínimo, seria enquadrado na teoria do domínio do fato.

O que me desencantou no filme foi a falta de ação e de emoção. Mais de duas horas de debate político é um pouco demais para mim. A colega Rosane de Oliveira adorou, mas este é o ramo dela. Achou os diálogos inteligentes, os textos ótimos. Tudo bem, disso não discordo. Mas seu Spielberg podia ter dado um pouquinho mais de movimento naquele blá-blá-blá.

Antes que me crucifiquem, pois ultimamente as pessoas andam pouco tolerantes com quem manifesta sua opinião, quero reconhecer que o filme certamente mexe com o sentimento de patriotismo dos americanos. O presidente assassinado é um herói nacional, foi o grande responsável pelo fim da escravidão no país – e só isso já é suficiente para o lugar de honra que ostenta na história da América.

Porém, uma coisa é a história, outra é o filme que busca recontá-la para um público de outro século. E nem da história gostei muito: fica a impressão de que subornar parlamentares e oferecer cargos em troca de votos é uma prática indissociável da democracia. Tudo por uma boa causa, é verdade. Mas não é isso o que dizem todos os governantes que incorrem em irregularidades para alcançar seus propósitos?

Preferiria não ter visto.

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