15 de agosto de 2012 |
N° 17162
ARTIGOS - Sebastião Ventura
Pereira da Paixão Jr.*
Cotas ao vento
O Senado aprovou no dia 7 de
agosto projeto de lei que determina a reserva de “no mínimo 50% (cinquenta por
cento)” das vagas nas universidades federais para alunos que cursaram o Ensino
Médio integralmente em escolas públicas.
Para tanto, foi estabelecido um
critério misto, dividido em quesitos ligados à renda familiar (igual ou
inferior a 1,5 salário mínimo per capita) e outro racial, vindo a beneficiar
negros, pardos e indígenas. O projeto será agora enviado para a sanção da
presidente, que, segundo consta, é uma entusiasta da proposta legislativa.
Aliás, o entusiasmo de alguns
chegou às raias da cegueira ideológica. Conforme matéria veiculada em
importante folha paulista, afirmou o senador Paulo Paim: “Não é justo que o preto
e pobre trabalhe de dia para pagar a universidade e estudar à noite enquanto o
branco descansa o dia todo”.
Ora, o ilustre representante
gaúcho deve ver a realidade com apenas um óculo de lente monocromática. A
assertiva senatorial, além de revelar sinais de perigosa e alva discriminação,
fecha os olhos para o fato de que, no Brasil multirracial, muitos pobres são
brancos que também trabalham de dia para pagar suas obrigações e, ainda,
estudar à noite. O registro, embora coberto por negras nuvens divorcistas, não
poderia passar em branco no azul do céu da nação.
Pois bem. É sabido que a colenda
Suprema Corte já decidiu que a política de cotas, dentro de um paradigma de
ações afirmativas para redução de históricas desigualdades nacionais, é válida
e constitucional. Isso, todavia, não significa que as universidades estejam
livres, leves e soltas para implementar medidas sem a observância de outras
regras cogentes e imperativas às diretrizes fundamentais da educação
brasileira. Nesse sentido, o projeto legislativo, em vias de sanção, possui
nítidos traços de inconstitucionalidade.
Sobre o ponto, há dispositivo
constitucional expresso, determinando que o acesso aos níveis mais elevados do
ensino, da pesquisa e da criação artística se dará “segundo a capacidade de
cada um” (art. 208, V, C.F.). Como se vê, a Constituição, objetivando resguardar
a excelência do Ensino Superior, estabeleceu um critério meritocrático de
acesso à universidade pública. Essa é a regra geral. Logo, para serem
constitucionais, as cotas devem ser utilizadas de forma acessória e subsidiária
e, sob hipótese alguma, poderão comprometer o mérito e a qualidade
universitária.
Falando nisso, o projeto possui
uma formosa sutileza jurídica: foi aprovada uma reserva de “no mínimo 50%
(cinquenta por cento)” das vagas, ou seja, a proposta legislativa fixou um
piso, deixando o teto ao livre sabor dos ventos. E os ventos poderão ser
arredios, vindo a deixar a biruta constitucional sem norte. Mas não será essa a
intenção por trás do sopro?
*ADVOGADO
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