PASQUALE CIPRO NETO
Mequetrefes, urbanos e
vilões
Agora
imagine o que teria ocorrido se a 'mequetrefe' não fosse cliente do advogado,
mas acusada?
O
JULGAMENTO do mensalão continua. E continua produzindo delícias verbais. A
criatividade e a imaginação dos causídicos que defendem os acusados não têm
fim. Lamento muito ter mais o que fazer, do contrário passaria horas diante da
TV para "aprender" com as sábias, saborosas e opíparas lições dos
nobres defensores dos engenheiros do mensalão, que, aliás, não existiu, é
invenção, a julgar pelo que dizem esses nobres representes da jurisprudência.
Dia
desses, um dos advogados que compareceram ao STF disse que Geiza Dias, sua
cliente, era "funcionária mequetrefe". E acrescentou: "De
terceiro ou quarto escalão, uma carimbadora de cheques". Didático, o nobre
advogado explicou que o termo é usado "lá em Minas" (ou "lá no norte
de Minas", não lembro). O mais interessante é que, de acordo com matéria
publicada pelo jornal "O Globo", o advogado afirmou que tinha pensado
em usar "baranga". Elaiá! E, ainda segundo essa matéria, a cliente
adorou o adjetivo que lhe foi sapecado. Elaiá, elaiá!
O
"Houaiss", que diz que o primeiro registro de "mequetrefe"
data de 1697, atribui ao termo estes sentidos: "1. Indivíduo intrometido,
dado a meter-se no que não é de sua conta; enxerido; 2. Indivíduo de caráter
duvidoso; patife, mariola, biltre; 3. Indivíduo sem importância, inútil,
insignificante; borra-botas, joão-ninguém".
A
pergunta que não quer calar: com qual dos sentidos terá o nobre patrono
empregado o adjetivo "mequetrefe"? E com qual dos dois sentidos de
"baranga" que o "Houaiss" dá ("de baixa qualidade; de
pouco ou nenhum valor", para "baranga" como adjetivo, e
"mulher feia, deselegante, mal-ajeitada", para "baranga"
como substantivo) teria empregado o termo, se o tivesse escolhido?
Agora
imagine o que teria ocorrido se a mulher qualificada de "mequetrefe"
não fosse cliente do próprio advogado, mas alguém que se quisesse acusar? Já
pensou o que faria a "txurma" do politicamente (in)correto? E por que
será que ninguém da "txurma" se manifestou depois da manifestação de
gosto duvidoso do nobre advogado? Estranho, não acha? Será que a
"txurma" já se cansou e resolveu lamber sabão ou pentear macacos?
Também
estranhei o silêncio da "txurma" depois que outro advogado usou a
palavra "urbanidade" numa situação que faria a "txurma"
ficar de cabelo em pé se soubesse um pouco de etimologia ("Não vamos
cometer a pouca urbanidade de entender que uma reunião...", disse o
causídico). O segundo sentido que o "Houaiss" dá a
"urbanidade" é este: "Conjunto de formalidades e procedimentos
que demonstram boas maneiras e respeito entre os cidadãos; afabilidade,
civilidade, cortesia". De onde vêm esses conceitos?
Por
que o vilão é vilão? E por que a urbanidade é o que é? Porque "vilão"
(do latim "villanus") vem de "vila", que, na origem,
significa "casa de campo, quinta". Em suma, o vilão é do campo, da
área rural, enquanto o urbano é da urbe, ou seja, da cidade, e é na cidade que
se aprendem as boas maneiras... Rarará! A julgar pelo que se vê nas cidades
brasileiras, nossa urbanidade não é lá tão urbana assim...
Cadê
a "txurma", meu Deus? Ninguém vai protestar contra o uso que fizeram
de "urbanidade" o referido advogado e o ministro Marco Aurélio Mello,
que disse que faltou urbanidade ao relator do processo do mensalão, o ministro
Joaquim Barbosa?
Bem,
pelo que já vimos, no circo do mensalão já foram localizados os mequetrefes e
os urbanos. Só faltam os vilões. É isso.
inculta@uol.com.br
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