quinta-feira, 16 de agosto de 2012


PASQUALE CIPRO NETO

Mequetrefes, urbanos e vilões

Agora imagine o que teria ocorrido se a 'mequetrefe' não fosse cliente do advogado, mas acusada?

O JULGAMENTO do mensalão continua. E continua produzindo delícias verbais. A criatividade e a imaginação dos causídicos que defendem os acusados não têm fim. Lamento muito ter mais o que fazer, do contrário passaria horas diante da TV para "aprender" com as sábias, saborosas e opíparas lições dos nobres defensores dos engenheiros do mensalão, que, aliás, não existiu, é invenção, a julgar pelo que dizem esses nobres representes da jurisprudência.

Dia desses, um dos advogados que compareceram ao STF disse que Geiza Dias, sua cliente, era "funcionária mequetrefe". E acrescentou: "De terceiro ou quarto escalão, uma carimbadora de cheques". Didático, o nobre advogado explicou que o termo é usado "lá em Minas" (ou "lá no norte de Minas", não lembro). O mais interessante é que, de acordo com matéria publicada pelo jornal "O Globo", o advogado afirmou que tinha pensado em usar "baranga". Elaiá! E, ainda segundo essa matéria, a cliente adorou o adjetivo que lhe foi sapecado. Elaiá, elaiá!

O "Houaiss", que diz que o primeiro registro de "mequetrefe" data de 1697, atribui ao termo estes sentidos: "1. Indivíduo intrometido, dado a meter-se no que não é de sua conta; enxerido; 2. Indivíduo de caráter duvidoso; patife, mariola, biltre; 3. Indivíduo sem importância, inútil, insignificante; borra-botas, joão-ninguém".

A pergunta que não quer calar: com qual dos sentidos terá o nobre patrono empregado o adjetivo "mequetrefe"? E com qual dos dois sentidos de "baranga" que o "Houaiss" dá ("de baixa qualidade; de pouco ou nenhum valor", para "baranga" como adjetivo, e "mulher feia, deselegante, mal-ajeitada", para "baranga" como substantivo) teria empregado o termo, se o tivesse escolhido?

Agora imagine o que teria ocorrido se a mulher qualificada de "mequetrefe" não fosse cliente do próprio advogado, mas alguém que se quisesse acusar? Já pensou o que faria a "txurma" do politicamente (in)correto? E por que será que ninguém da "txurma" se manifestou depois da manifestação de gosto duvidoso do nobre advogado? Estranho, não acha? Será que a "txurma" já se cansou e resolveu lamber sabão ou pentear macacos?

Também estranhei o silêncio da "txurma" depois que outro advogado usou a palavra "urbanidade" numa situação que faria a "txurma" ficar de cabelo em pé se soubesse um pouco de etimologia ("Não vamos cometer a pouca urbanidade de entender que uma reunião...", disse o causídico). O segundo sentido que o "Houaiss" dá a "urbanidade" é este: "Conjunto de formalidades e procedimentos que demonstram boas maneiras e respeito entre os cidadãos; afabilidade, civilidade, cortesia". De onde vêm esses conceitos?

Por que o vilão é vilão? E por que a urbanidade é o que é? Porque "vilão" (do latim "villanus") vem de "vila", que, na origem, significa "casa de campo, quinta". Em suma, o vilão é do campo, da área rural, enquanto o urbano é da urbe, ou seja, da cidade, e é na cidade que se aprendem as boas maneiras... Rarará! A julgar pelo que se vê nas cidades brasileiras, nossa urbanidade não é lá tão urbana assim...

Cadê a "txurma", meu Deus? Ninguém vai protestar contra o uso que fizeram de "urbanidade" o referido advogado e o ministro Marco Aurélio Mello, que disse que faltou urbanidade ao relator do processo do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa?

Bem, pelo que já vimos, no circo do mensalão já foram localizados os mequetrefes e os urbanos. Só faltam os vilões. É isso.

inculta@uol.com.br

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