terça-feira, 28 de agosto de 2012



28 de agosto de 2012 | N° 17175
LUÍS AUGUSTO FISCHER

Homens interessantes

Quem já passou os olhos pela obra crítica de Walter Benjamin (1892 – 1940), o grande, talvez o maior dos pensadores da chamada Escola de Frankfurt, por certo bordejou o ensaio O Narrador – Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. Lembra?

Aquele em que Benjamin filosofa sobre o declínio da arte de narrar, no mundo moderno, em comparação com a antiga sabedoria dos narradores comunitários. Aquele em que ele postula a existência de dois arquinarradores, o marinheiro comerciante e o camponês sedentário, o primeiro capaz de contar coisas interessantes pelo fato de conhecer o mundo horizontalmente, na extensão geográfica, o segundo idem por conhecer o mundo verticalmente, na profundidade histórica.

Se o prezado leitor não leu ainda, sinceramente, já não é sem tempo: trata-se de um dos mais singulares e profícuos ensaios sobre narrativa que a humanidade já produziu.

Ao lê-lo a gente se dá conta da grande pertinência histórica do comentário; para não ir longe, com este ensaio o grande pensador ajuda a entender a força literária de Simões Lopes Neto e sua principal criatura, Blau Nunes, que de certa forma funde os dois arquétipos, por ser velho habitante da grande aldeia sul-rio-grandense e, simultaneamente, um viajante da geografia gaúcha.

O caso é que o autor que Benjamin toma como guia da conversa toda era muito mal editado no Brasil. Que eu soubesse, havia apenas uma edição, contendo duas novelas dele, com tradução de Otto Schneider, edição da Melhoramentos sem data explícita, parece que década de 1960. Foi neste volume que eu li Apenas um Retrato de Mulher, sensacional relato, em si e em sua capacidade de exemplificar a tese de Benjamin.

O caso é que agora saíram duas coletâneas de textos de Leskov pela editora 34, com tradução mais rigorosa, que, entre outros méritos, reproduz em português as vozes que aparecem no original, gente iletrada falando iletradamente etc. Indico uma: Homens Interessantes, com tradução de Noé Oliveira Policarpo Polli, professor de russo na USP.

Li o volume com enorme proveito, tanto pelos contos quanto pelo posfácio do tradutor, com material farto para pensar melhor sobre Benjamin (e Simões Lopes Neto, de novo e sempre). E ali descubro que o nome da novela Apenas um Retrato de Mulher é, no original agora restaurado, exatamente Homens Interessantes. Que diferença...

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