17
de agosto de 2012 | N° 17164
ARTIGOS
- OTILIA BEATRIZ KROEFF CARRION*
Violência
consentida
A
questão da segurança é uma das maiores preocupações da população, que se sente
ameaçada e impotente diante da escalada da violência. A criminalidade, que
antes afetava principalmente os grandes centros urbanos, disseminou-se,
atingindo inclusive os pequenos municípios e áreas rurais.
Preocupação
legítima, portanto, pois o banditismo cresce, assusta e intimida. Existe, não
obstante, uma outra forma de violência, aparentemente menos perniciosa, mas
imprevisível, e que é, por vezes, mais difícil de se evitar e punir. Refiro-me
à violência do dia a dia, praticada pelos ditos cidadãos de bem.
Senão,
a título de exemplo, vejamos algumas situações do cotidiano de nossas cidades.
O mesmo pai de família que com razão fica indignado diante da prática de
bullying contra filho seu é capaz de agredir e insultar em via pública, em face
de uma contrariedade no trânsito. Compreensível?
Há,
também, o cidadão (ou cidadã) que aos esbarros (pedido de licença nem pensar e
de desculpas menos ainda) passa à frente de todos, seja no caixa, no elevador,
na fila de embarque ou em situações similares. Razoável? Situações de clientes
atendidos com desleixo e de produtos que não funcionam se repetem, e há, ainda,
os que se permitem o direito de invadir sistemática e insistentemente a
privacidade alheia (inalienável, vale lembrar) para vender a qualquer custo a
sua mercadoria ou serviço. Aceitável? E os exemplos se multiplicam.
Práticas
como essas, tipicamente antissociais, não subtraem o patrimônio nem provocam
doença ou morte imediata, mas alteram comportamentos, afetam o convívio social,
comprometem projetos e sonhos.
E o
poder público tem sua parcela de responsabilidade nisso tudo quando não mantém
adequadamente a infraestrutura das cidades, como vias públicas, sinalização
urbana, equipamentos de uso coletivo e serviços essenciais (como saúde),
comprometendo, dessa forma, o exercício pleno da cidadania e agravando o quadro
de precariedade nas relações sociais.
Pelo
fato de as cidades constituírem espaços aglomerados, que propiciam o encontro,
a convergência e a sociabilidade, elas deveriam ser centros de prática social
civilizada e civilizadora e não arenas de embate permanente.
Diante
do que vem ocorrendo, talvez tenhamos de reaprender o exercício saudável da
cidadania, da convivência solidária, sob pena de sucumbirmos todos à violência
cotidiana, que está se tornando uma violência consentida, tolerada pelos que
preferem silenciar a pretexto de que não lhes compete, ajudando assim a
perpetuar essa situação. Até quando?
*ECONOMISTA
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