03 de fevereiro de 2016 | N° 18434
MOISÉS MENDES
Intocáveis
O documentário Entreatos, de João Moreira Salles, sobre a campanha da primeira eleição de Lula, em 2002, tem uma cena reveladora de quem era José Dirceu. A equipe de filmagens entra na sala em que ele coordena uma reunião com Guido Mantega e Gilberto Carvalho. É forte a reação do poderoso coordenador da campanha de Lula. Dirceu quer saber como eles entraram sem pedir licença.
Carvalho diz que a equipe é de confiança. Dirceu rebate dizendo que “não existe confiança absoluta”. Fica irritado e parece querer mostrar que manda em Mantega e em Carvalho. Sabe-se que mais adiante chegou a achar que mandaria em Lula.
Dirceu apareceu na segunda-feira em outros vídeos,no depoimento ao juiz Sergio Moro. Ele explica ao juiz como escolhia os diretores da Petrobras. E faz um desabafo:
– Eu não consigo aceitar a minha prisão, doutor Moro.
Condenado a sete anos e 11 meses de cadeia pelo mensalão, Dirceu foi preso em novembro de 2013. Em outubro de 2014, ganhou direito à prisão domiciliar. Em agosto do ano passado, voltou para a cadeia por causa da Lava-Jato.
Dirceu não queria ser filmado lá em 2002 porque tratava de detalhes da posse de Lula. Nesta semana, foi filmado de novo dizendo outras coisas que não queria que ouvissem. Mas uma coisa, pelo menos uma, ele queria tornar pública.
O que ele disse a Moro, para todo mundo ouvir, foi que a indicação do propineiro Renato Duque para a direção de Serviços da Petrobras foi do PSDB. Duque seria indicação não necessariamente de Aécio Neves, mas dos tucanos.
Ninguém vai acreditar em Dirceu, mesmo que ele tenha dito que a escolha estaria dentro da lógica de Furnas, estatal do sistema Eletrobras controlada oficialmente pelo PTB em nome de gente do PSDB.
A existência de Dimas Toledo, o homem dos tucanos em Furnas (via PTB), poderia explicar a escolha de Renato Duque. Dirceu jogou Duque, um dos mafiosos graúdos, no colo do PSDB. E o que isso significa? Nada.
O Zé Dirceu lá do filme Entreatos virou um zumbi. Imagine se irão investigar a sua estranha versão para a indicação de Duque, se não investigaram a fundo nem a história dos propineiros de Furnas na gestão de Dimas, sempre apontado como um infiltrado tucano.
Dirceu não tem força para acusar ninguém, muito menos um tucano. Nem Judas, se ressuscitasse hoje, seria levado a sério ao delatar um tucano.
Todos os tucanos, dos que voam alto aos que ainda estão aprendendo a voar, são intocáveis, as únicas figuras absolutamente confiáveis da política brasileira. A não ser que a Justiça, em algum momento, decida dizer o contrário.
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