quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016



03 de fevereiro de 2016 | N° 18434
EDUCAÇÃO

Há excesso numa ponta e falta na outra


A comparação entre as informações de renda dos 5.457 candidatos aprovados no vestibular da UFRGS de 2014 e os dados da Pesquisa Anual por Amostra de Domicílios (Pnad) do mesmo ano evidenciam a desigualdade no acesso ao Ensino Superior: 

- Na UFRGS, 8,65% dos calouros declararam renda familiar superior a 20 salários mínimos (hoje, R$ 17,6 mil). No Brasil e na Região Sul, só 2,1% das famílias recebiam o equivalente. 

- 22,7% dos aprovados eram de famílias com rendimentos de pelo menos 10 salários mínimos (R$ 8,8 mil). No Brasil, apenas 7,5% dos domicílios tinham rendimentos maiores (o percentual sobe para 9,2% na Região Sul). 

- 45,9% dos novos alunos vinham de famílias com renda acima de cinco salários mínimos (R$ 4,4 mil). No Brasil, somente 22,9% dos lares ganhavam mais do que cinco mínimos. Na Região Sul, eram 30%. 

- 26,4% dos calouros tinham renda familiar de até três salários mínimos (R$ 2.640). No Brasil, 52,3% dos domicílios recebiam até três salários mínimos. Na Região Sul, o percentual era de 41,3%. 

As informações foram analisadas pelo professor de Economia da Universidade Federal de Pelotas Felipe Garcia, pesquisador de políticas públicas de educação, saúde e mercado de trabalho. 

– Há sobre-representação dos ricos, enquanto os pobres estão sub-representados. Vale dizer que isso ocorre a despeito das políticas de cotas para o ingresso – comenta Garcia, para quem os dados suscitam diversas questões para a criação de políticas públicas de educação e de combate às desigualdades. – As respostas não são óbvias. 

Garcia sustenta que, se o desejo das universidades é gerar pesquisa em conhecimento, o que pode acarretar em progresso tecnológico e crescimento econômico a longo prazo, não importaria o perfil socioeconômico dos estudantes, apenas que os melhores fossem selecionados. Mas se a promoção de oportunidades e suavização da pobreza forem prioridades, o processo de seleção de novos alunos deve ser reconsiderado.

É INCONSTITUCIONAL?


- Não é a primeira vez que uma proposta quer acabar com a gratuidade do Ensino Superior público para os mais ricos. O próprio senador Marcelo Crivella, há 10 anos, já havia apresentado projeto quase idêntico, que, na época, foi rejeitado pela Comissão de Educação por ser considerado inconstitucional.
- É que o inciso 4.º do artigo 206 garante a “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”.
- Apenas uma proposta de emenda à Constituição (PEC) poderia alterar esse princípio.
- A PEC 395/14, do deputado federal Alex Canziani (PTB- PR), foi aprovada em primeiro turno na Câmara em outubro de 2015. Ele quer mudar o princípio da gratuidade, permitindo a cobrança para cursos de pós-graduação, como especialização e mestrado profissional. Apenas cursos regulares de graduação, mestrados e doutorados teriam a gratuidade assegurada na Constituição.
- Segundo Eduardo Carrion, professor titular de Direito Constitucional da UFRGS e da Fundação Escola Superior do Ministério Público, o debate jurídico no país tem admitido uma cobrança específica para certas modalidades de cursos, porém isso não incluiria a graduação.
- “Há de se reconhecer as dificuldades orçamentárias do poder público, mas não podemos, com isso, atingir conquistas sociais importantes como o Ensino Superior gratuito. Mesmo uma PEC para instituir uma cobrança na graduação suscitaria outro debate, sobre o retrocesso ou não em direitos sociais”, avalia o jurista.

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