quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016



17 de fevereiro de 2016 | N° 18448
ESPECIAL


CERCO A PEÇAS SUSPEITAS EM DESMANCHE IRREGULAR

OPERAÇÃO, QUE BUSCA peças sem origem comprovada nos depósitos, é a primeira de grande porte após a sanção de lei que tenta coibir o roubo de carros no Rio Grande do Sul

Equipes da segurança pública estadual mobilizaram-se para uma ofensiva contra os desmanches irregulares na manhã de ontem. No total, 82 homens da Brigada Militar, Polícia Civil, Detran e Instituto-Geral de Perícias verificaram a situação de peças veiculares armazenadas em estabelecimentos na Avenida Sertório, na altura do número 9.780, na zona norte de Porto Alegre.

Três estabelecimentos da Avenida Sertório foram escolhidos a partir das informações do setor de Inteligência para ser o foco da ação. Em um deles, o Barão Imports, foram presas quatro pessoas, o proprietário e mais três funcionários. O local funcionava irregularmente, sem credenciamento do Detran, e não havia comprovante de procedência de nenhuma das milhares de peças estocadas. 

O homem que se apresentou como dono, acusado de receptação qualificada e adulteração de sinal identificador de veículo, também não dispunha de documentação da loja. Foi verificado que, no local, estavam peças retiradas de carros roubados. Ainda pela manhã, foi anunciado o fechamento do Barão Imports. Caminhões encostaram em frente ao estabelecimento para recolher todas as peças e restos de carros. O material será triturado.

Em um segundo local fiscalizado, não havia nenhum responsável, mas a operação encontrou dois veículos roubados dias atrás, ambos já desmanchados. Lá estavam um Astra e uma Mitsubishi Lancer, alvo da ação de criminosos nos dias 5 e 12 de fevereiro de 2016, respectivamente. Depois de depenados, restaram apenas partes dos automóveis, como as portas, capô, bancos e painel do volante. Esse estabelecimento não tinha nenhuma identificação ou letreiro. Policiais envolvidos com a operação acreditam se tratar de uma garagem utilizada somente para desmanche. No seu interior, ela tinha ligação com outros dois galpões que ficavam do seu lado esquerdo.

– Já podemos dizer que essa ação, dentro do planejamento estratégico de enfrentamento da receptação e roubo e furto de veículos, já é um sucesso, com base na legislação construída em 2015. É a primeira (operação) de muitas, temos um longo caminho pela frente em 2016 – afirmou Wantuir Jacini, secretário da Segurança.

Ações serão intensificadas, afirma secretário

Ele ainda disse que a prioridade é fazer mais ações semelhantes em Porto Alegre e na Região Metropolitana. Não há data definida, mas, ao longo do ano, a iniciativa deverá ser estendida ao Interior.

– Onde não houver estrutura maior, vamos mandar reforço de outros locais – explicou Jacini, se referindo à grande mobilização necessária para fiscalizar os estabelecimentos.

Esta é a primeira operação de grande porte após a sanção do governador José Ivo Sartori à lei dos desmanches, em dezembro. Pela nova legislação, qualquer peça que estiver em ferros-velho sem comprovante de sua procedência, com nota fiscal, será considerada ilegal e poderá ser imediatamente recolhida. A fiscalização é do Detran, de caráter administrativo, mas as polícias acompanham para dar suporte. O IGP é responsável por verificar as origens das peças.

A operação também foi acompanhada por três empresas recicladoras credenciadas pelo Detran. Elas foram no local com caminhões utilizados para recolher os produtos ilegais. Tudo o que foi retirado dos desmanches será enviado para processo de trituração. Depois de destruído, o material reciclado, como o ferro, poderá ser vendido pelas empresas, que terão de pagar ao Detran um valor por cada quilo recolhido, diz Carla Badaraco, diretora-técnica do Detran.

A nova lei dos desmanches e a possibilidade de retirar de circulação peças sem procedência em larga escala é uma das apostas do secretário de Segurança, Wantuir Jacini, para reduzir os altos índices de furto e roubo de veículos em Porto Alegre. Indicativo da relevância dada pelo governo à iniciativa, o secretário Jacini, alvo de recentes críticas por sua atuação, acompanhou pessoalmente a operação. O comandante-geral da Brigada Militar, coronel Alfeu Freitas, e o recém-nomeado chefe de Polícia, Emerson Wendt, também foram ao local, junto de Jacini.

A realização de ações policiais de grande porte é uma das estratégias do Palácio Piratini para mostrar serviço e contrapor a sensação de paralisia diante da crise na segurança.

Terreno de desmanche pertence à prefeitura

Considerado um dos grandes comércios de peças ilegais na zona norte da Capital, o estabelecimento Barão Imports, no número 9.793 da Avenida Sertório, possui relações imobiliárias com a prefeitura de Porto Alegre. A loja, fechada ontem após ação coordenada pela Secretaria Estadual da Segurança Pública para combater os desmanches de veículos, funciona em um terreno que pertence ao município. Documento obtido por Zero Hora mostra que a prefeitura cede a área em que funciona a Barão Imports, receptora de peças de automóveis roubados, desde dezembro de 2012. Em troca, o Executivo cobra do estabelecimento taxa mensal de R$ 292,04.

Procurada por ZH, a prefeitura confirmou ser dona e cedente de parte do terreno, e prometeu retomar a área. A reportagem ligou para o telefone que consta no registro da Alexandre Trindade Nunes ME na Receita Federal, a quem a área foi cedida, mas o número retornou como inexistente.

CARLOS ROLLSING

A LEGISLAÇÃO

Lei federal 12.977, de 2014
-Estabeleceu normas para desmontagem de veículos no país, prevendo regras mais amplas. Entrou em vigor em 20 de agosto de 2015.

-Determinou o credenciamento dos desmanches pelos órgãos estaduais de trânsito e criou um banco nacional de informações de veículos desmontados para registros de peças usadas à venda.

-Peças sem condições de uso ou sem procedência são consideradas sucatas. Quem desrespeitar a lei está sujeito a multa de até R$ 8 mil, interdição ou cassação do registro de contribuinte.

-No ano passado, o Departamento Estadual de Trânsito (Detran) cadastrou os ferros-velhos interessados em se regularizar como Centro de Desmanche Veicular (CDV). Conforme o Detran, há 212 CDVs cadastrados – que têm até 20 de agosto deste ano para se adequarem às novas exigências da lei – e mais de 100 em processo de regularização.

-Empresas que não se cadastraram conforme determina a lei são consideradas clandestinas. No Estado, esse número chega a 1,3 mil desmanches.

Lei estadual 325, de 2015

-Aprovada pela Assembleia no final do ano passado, se adaptou à lei federal, disciplinando a regra de apreensão de autopeças no Rio Grande do Sul.

-Peças sem condições de uso ou de procedência duvidosa serão recolhidas para reciclagem (transformação em outro produto), caso o dono não comprove origem lícita. As que apresentarem risco ambiental serão destruídas de imediato.

-A regulamentação da lei foi publicada em 7 de dezembro de 2015, autorizando, por exemplo, o esmagamento das peças em que o comerciante não conseguir provar a origem lícita. A empresa tem prazo de cinco dias para apresentar documentos probatórios de regularidade das peças recolhidas.

Nenhum comentário: