segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016


08 de fevereiro de 2016 | N° 18439 
DAVID COIMBRA

O Ocidente efeminado

Alemães saíram às ruas aos milhares, neste fim de semana, para protestar contra os imigrantes muçulmanos e a “islamização” da Europa. Trata-se de um movimento de raiz xenófoba que, nos últimos anos, só cresce no Velho e bom Mundo. Corresponde, talvez, a essas coisas de Trumps nos Estados Unidos e Bolsonaros no Brasil.

Há quem diga que é o “ressurgimento da direita”. Não é. Tem a ver com a feminilização do Ocidente.

As pessoas se confundem, quando pensam em termos de “esquerda” e “direita”. Econômica e politicamente, esquerda e direita podem ser compreendidas quando você contrapõe outras duas forças que, quase sempre, têm de coexistir: o Estado e o mercado.

A possibilidade de o mercado não existir só se dará se você atingir o comunismo perfeito, que é uma ficção.

A possibilidade de o Estado não existir só se dará se você atingir o anarquismo perfeito, que também é uma ficção.

Salvo essas duas exceções, que, aliás, são bastante implausíveis, o mercado e o Estado precisam conviver, e convivem. É aí que se dá o jogo de pressão e contrapressão entre a direita e a esquerda.

Você pode traçar uma linha, colocando numa ponta o Estado e na outra o mercado. Quanto mais perto do Estado você estiver, mais à esquerda você estará. Quanto mais perto do mercado, mais à direita.

Isso num mundo teoricamente ideal. O problema é que a realidade teima em bagunçar a teoria.

Veja o caso do Brasil. O governo do PT é de esquerda. É a favor do Estado forte e interventor. Mas o governo militar, de direita, também era a favor do Estado forte e interventor. Mais: as características de ambos os governos são idênticas. Os dois são nacionalistas, estatizantes, desenvolvimentistas e administram o bem social por programas. Só que um está na ponta esquerda e outro na ponta direita daquela nossa linha.

Como se explica esse fenômeno?

A resposta poderia ser encontrada no que dizia um velho ídolo da direita, o senador Roberto Campos, que a esquerda apelidou de Bob Fields, por sua admiração pelos Estados Unidos.

Roberto Campos, que foi ministro e embaixador no governo militar, criticava o governo militar. Afirmava que o Brasil nunca havia sido verdadeiramente capitalista, e sim que o capitalismo brasileiro era “patrimonialista”. E é. O capitalismo brasileiro jamais foi realmente capitalista, foi sempre “socialista patrimonial”, devido à proteção estatal dada ao grande capital. É fácil se dizer capitalista quando você não corre os riscos inerentes ao capitalismo.

Agora veja outra aparente contradição: Bernie Sanders, pré-candidato dos Democratas a presidente dos Estados Unidos, se diz socialista, e faz quase que o mesmo raciocínio de Roberto Campos. Sanders é um feroz crítico à proteção que o Estado americano oferece ao sistema financeiro. Isto é: aos bancos. Sobretudo os grandes bancos.

Sanders propõe que novos impostos cobrados dos bancos financiem a universidade da classe média americana. Assim, o sistema de Educação nos Estados Unidos estaria todo garantido pelo Estado, já que, nos antigos primeiro e segundo grau, as crianças recebem até o material escolar de graça (mochila, lápis, caderno, o meu filho ganhou tudo da escola).

Curiosamente, esse é um instrumento tido como socialista. Nos Estados Unidos, o campeão do capitalismo! Como pode? Para aumentar a confusão, do outro lado do mundo aparece a China, furioso comunismo maoísta até 1978, quando Deng Xiaoping decretou que “enriquecer é glorioso”. Então, a China tornou-se um híbrido: politicamente comunista, economicamente capitalista.

Mas será que é assim mesmo? Vou tentar destrinchar isso tudo no próximo texto, e falar, afinal, da feminilização do Ocidente.

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