segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016



29 de fevereiro de 2016 | N° 18460 
DAVID COIMBRA

Pensem no bem que o PT fez

Todos esses milhões, esses bilhões que regurgitam esgoto afora, nas operações anticorrupção, me deixam confuso. O que é muito dinheiro? O que é pouco. Já não sei mais. Sei o que é muito ou pouco PARA MIM. Mas para o apetite Deles?...

É tudo hiperbólico nesse sistema. Estamos diante da nossa pirâmide de Quéops, da nossa Basílica de São Pedro, da nossa Grande Muralha. Essa obra urdida nos últimos 14 anos talvez seja a maior operação político-criminosa da história da humanidade. Não é exagero. As confissões do marqueteiro João Santana e sua mulher expõem o que as pessoas, de certa forma, já intuíam: foi articulado um gigantesco e caudaloso esquema internacional de corrupção.

Santana e a mulher admitiram ter recebido pagamento saído do caixa 2 em lugares como Angola, Panamá e Venezuela. São países de regimes semelhantes ao brasileiro. Esse dinheiro entrou no caixa 2 a partir de obras tocadas pela empreiteira Odebrecht.

O ex-presidente Lula admite que visitou esses “países amigos” a fim de “abrir mercados” para a Odebrecht. A Odebrecht admite que pagou milhões ao ex-presidente Lula para que ele desse palestras nos países amigos, ensinando-os como salvar seus respectivos povos da fome. João Santana foi o marqueteiro deles todos: de Lula, de Dilma e dos dirigentes dos países amigos, quase todos pequenos ditadores, Stálins caboclos.

Ao mesmo tempo, surge a assombrosa história do sítio de Lula. A defesa de Lula diz que o filho de um amigo de Lula resolveu comprar o sítio para que Lula usasse. Só que Lula não sabia disso. Aí, a Odebrecht fez reformas no sítio. Só que Lula não sabia disso. A OAS fez a cozinha. Só que Lula não sabia disso. As coisas de Lula saíram do Planalto em caminhões de mudança e foram para o sítio. Só que Lula não sabia disso. Finalmente, a Oi instala ao lado do sítio uma grande antena. Só que Lula não tem celular.

Por favor!

Está tudo muito claro. Mas tenho de ressaltar: não sou desses indignados com a corrupção, a despeito de a corrupção ser digna de indignação. Sempre sublinhei que o maior problema desse governo foi não ter feito as reformas de que o Brasil necessita, mesmo tendo sido Lula uma espécie de rei por pelo menos por uma década.

Tampouco me agradam as alternativas que se apresentam ao PT, seja o amorfo PSDB, seja esquisitices como Bolsonaro ou o PSOL. Finalmente, reconheço que o brasileiro tem de fato uma cultura por demais flexível em relação à lei. Sempre houve algum tipo de contravenção em todos os estamentos da sociedade.

Mas não dessa dimensão.

Essa máquina intercontinental de uso do dinheiro público para manutenção no poder e de manutenção no poder para uso do dinheiro público é de uma sofisticação e de uma abrangência inéditas. É uma rede interconectada de governos, empresas, organizações supostamente sem fins lucrativos, escolas, universidades e até associações religiosas. Tudo liderado pelo Brasil.

Mais: tudo só tornado possível graças à boa vontade de milhões de mulheres e homens figadalmente honestos. Mais ainda: só tornado possível por existirem muitos outros milhões de mulheres e homens carentes das mínimas condições de vida decente.

É verdade que Lula ajudou a matar a fome de milhões. É verdade. E isso é muito importante. Um esquema desses só funciona baseado em algum mérito. O mérito de Lula e do PT foi dar um pouco de atenção a quem não ganhava nem olhar de pena.

É preciso entender por que um engenho de tal forma ramificado cresceu a esse ponto. Só vamos sair dessa se compreendermos como entramos nessa. Não vai adiantar apenas haver indignação. Há de haver reflexão e reconhecimento.

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