quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016


18 de fevereiro de 2016 | N° 18449 
DAVID COIMBRA

Um herói de quem ninguém se lembra


Volta e meia me pego pensando nas delícias de ser presidente. Não que as tenha provado. Jamais fui presidente de qualquer coisa, o que é uma lástima. Mesmo assim, tenho certeza de que ser presidente é bom demais.

Aqui, nos Estados Unidos, existe o President’s Day. O Dia do Presidente. Homenageia todos os presidentes, vivos e mortos, até o Bush. É feriado nacional. Foi agora, segunda passada.

Os americanos adoram um presidente. Você não vai se lembrar, nem o Ticiano Osório, que é especialista em quadrinhos, haverá de saber, mas havia um super-herói americano chamado Super-Presidente. O cara tinha mais poderes do que o Super-Homem, virava inclusive ácido, se quisesse. E ainda era presidente da República. O único que conhecia a identidade secreta dele era um assessor da Casa Branca. Eu assistia àquele desenho e ficava intrigado com um detalhe: se o herói se chamava Super-Presidente, como é que as pessoas não desconfiavam que ele era, justamente, o presidente?

Imagine uma heroína brasileira que se veste de capa e tailleur vermelhos, grita “pelos poderes da mandioca!” e que se apresenta como Super-Presidenta. Quem você acha que é? Ahn? É claro que descobriríamos.

Os americanos são muito ingênuos.

Ser presidente é tão bom, que quem é não quer deixar de ser. Veja como se esforçam Dilma e Cunha para continuar em suas respectivas presidências. Para eles, nada mais importa, o Brasil, o povo, nada, desde que fiquem presidentes.

O Fernando Henrique, quando estava nos últimos dias da sua presidência, cantou, com antecipada nostalgia, uma canção do Roberto Carlos:

“Já está chegando a hora de ir. Venho aqui me despedir e dizer:

Em qualquer lugar por onde eu andar. 

Vou lembrar de você...”.

Ele já suspirava de saudade. Afastava-se do poder com certa relutância resignada, como o namorado viajante que solta um a um os dedinhos da amada ao entrar no trem. Posso ver Fernando Henrique no vagão que segue rumo à vida pedestre dos não presidentes, lançando um último olhar para a estação que se distancia e levando as mãos em concha ao rosto, para sentir o odor adocicado daquilo que não é mais dele.

É bonito ser presidente. Mas nosso Super-Presidente não seria Fernando Henrique. Ele é muito... normal para ser super. Nem Dilma, que é meio atrapalhada.

Seria Lula. Sem dúvida.

Tive certeza disso ao entrevistarmos ontem, no Timeline da Gaúcha, o deputado Elvino Bohn Gass. Naquele momento, ele e outros deputados petistas estavam no Instituto Lula, prestando apoio a ele, Lula, que não queria (e não foi) prestar depoimento ao Ministério Público de São Paulo.

O deputado repetiu todos os clichês dos petistas menos requintados, aquilo de que Lula é perseguido porque salvou os pobres etc. Surpreendeu-me um pouco a falta de refinamento na argumentação. Afinal, trata-se de um deputado. Mas o que de fato me espantou foi constatar que ele ACREDITA mesmo naquilo. Pela emoção quase soluçante na voz do deputado, percebi que ele acha, de fato, que Lula é um santo e que, por causa dele, não existem mais miseráveis no Brasil. Para arrematar, Bohn Gass fez questão de encerrar a entrevista com uma espécie de slogan que é tão pungente, tão patético, tão compassivo, que me comoveu:

– Mexeu com Lula, mexeu comigo!

Fiquei com dó. Espero que não prendam Lula, o Pai dos Pobres, o messias, o Super-Presidente. Não é agradável de se ver o espetáculo das ilusões despedaçadas.

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