sábado, 27 de fevereiro de 2016



27 de fevereiro de 2016 | N° 18458 
NÍLSON SOUZA

TALVEZ


Sou um velho jornalista que se esforça para não se tornar um jornalista velho. Pode parecer apenas um jogo de palavras, mas a colocação do adjetivo tem lá o seu sentido. Observem: comi um bom churrasco, comi um churrasco bom. Qual é o melhor? Bem, volto às minhas chinelas para comentar uma pergunta que me fazem todos os dias desde que a internet e as redes sociais entraram nas nossas vidas:

– Afinal, o jornal impresso vai mesmo acabar?

Antes de responder, reconto uma história do folclore chinês que li no jornal El País, da Espanha.

“Um dia, o cavalo de um camponês fugiu. Seu vizinho lhe disse:

– Que azar você teve!

O agricultor respondeu:

– Talvez.

No dia seguinte, o animal retornou acompanhado de cinco éguas. O homem voltou e o felicitou:

– Que sorte você teve!

O dono replicou:

– Talvez.

Pouco depois, o filho do camponês, que estava acostumado a montar a cavalo, caiu e quebrou uma perna. O amigo lhe comentou:

– Que azar você teve!

Este respondeu: – Talvez.

No dia seguinte, chegaram alguns oficiais do Exército querendo recrutar o moço para lutar na guerra, mas não puderam levá-lo porque estava com a perna quebrada. Então o vizinho exclamou:

– Que sorte você teve!

O pai repetiu:

– Talvez.”

E assim se poderia seguir indefinidamente para provar que nada é definitivo, mesmo quando uma tendência parece inexorável. Há quem deteste o “talvez”, por denotar indecisão e imobilismo. Mas o advérbio pode ser também uma manifestação de sabedoria, pois abre espaço para o imprevisível.

Talvez o jornal impresso acabe um dia, talvez não. Três anos atrás, foi divulgado um estudo da consultoria norte-americana Future Exploration Network, com uma tabela da morte do jornal de papel em diversos países. Para o Brasil, o ano fatídico é 2027. Mas, para os Estados Unidos, já é o ano que vem, 2017. Muitos jornais norte-americanos continuam rodando suas edições impressas. Como dizia um antigo treinador de futebol do nosso Estado, vamos ver...

Penso, então, que o jornal até pode acabar um dia, mas o jornalismo jamais acabará. Principalmente enquanto continuar contando boas e emblemáticas histórias, como essa do cauteloso chinês.

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