Martha
Medeiros
Frustração
A história resumida: uma amiga
estava há dois meses saindo com um homem bacana. Ele, perdulário em declarações
de amor, a convidou para ir a Paris. Ulalá. Ela vibrou. Dez dias antes do
embarque, ele mandou um e-mail dizendo que havia voltado para a
ex-mulher.Sacanagem, pensamos. Mas sacanagem talvez seja um diagnóstico
simplista.
Ele estava tentando dar um novo
rumo à sua vida, porém não contava com o assédio da ex-esposa, seu verdadeiro
grande amor. Fez sua opção, e quem morreu um pouco foi minha amiga. Alguém
sempre paga o pato. O assunto de hoje é uma velha conhecida de todos nós: a
frustração. Jogue a primeira pedra quem já não caiu do cavalo (foi frustrado)
ou roeu a
corda (frustrou alguém). Somos
todos experts em sonhos desfeitos.
Existe coisa pior na vida, claro
que existe, mas considero a frustração uma das sensações mais indigestas. O
emprego é seu! Chegando ao escritório para entregar seus documentos, descobre
que o posto já foi preenchido. Você quase passou no vestibular! Por uma vaga,
umazinha só, ficou de fora do listão. A bolsa para estudar na Inglaterra saiu!
Pena que o governo decretou um
depósito compulsório de última hora e você não tem como pagá-lo. A garota que
você está a fim chamou para a festa! Chegando lá, encontra a bisca agarrada no
seu melhor amigo. Me veio à cabeça mais
uns 456 exemplos de frustrações, algumas baseadas em experiências pessoais. Mas
você tem sua própria lista para recordar, não serei tão cruel. O fato é:
durma-se com esse embrulho no estômago.
É sabido que uma das regras de
bem educar uma criança é ensiná-la a lidar com frustrações. Seu bebê amado não
será alto o suficiente para ser um campeão de basquete, nem sua lindinha terá
as melenas loiras necessárias para ser a princesa do teatrinho da escola. Ou
você mente e desvirtua a situação para aplacar a dor dos seus rebentos, ou
permite que eles enfrentem essa dolorosa seleção natural e explica: não é isso
que mede a importância de alguém.
Papai e mamãe te amam de qualquer
jeito. Grande prêmio de consolação, pensam os baixotes.Porém, baixotes, é isso
mesmo. “Papai e mamãe te amam” é tudo o que vocês precisam saber para se lixar
para as coisas que não dão certo. E acreditem: um bilhão de coisas não darão
certo, dos cinco aos 105 anos.
Só tendo sido suficientemente
amado e protegido dentro do lar para entender que o que não deu certo é uma
contingência da vida e que, dependendo do nosso grau de autoconfiança, poderá
causar apenas cinco dias de mau humor em vez de uma dor existencial infinita.
Acredite: os cinco dias de
frustração não farão mal nenhum a seu crescimento, pelo contrário, será parte
fundamental dele. A dor existencial é que nos engessa e paralisa para
sempre. Lido razoavelmente bem com
frustrações.
Sofro os cinco dias protocolares,
e depois retiro delas alguma lição que me torne mais aderente a decepções
futuras – ambiciono chegar ao dia em que a frustração não doerá nem mais cinco
minutos. Conseguirei?
Na verdade, não pretendo
colecionar frustrações para quebrar meu recorde de resistência. Se pudesse, não
sofreria mais nenhuma. Mas isso equivaleria a não estar mais disposta a viver.
Então, que venham as danadas. Uma de cada vez, que sou forte, mas não sou duas.
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