domingo, 13 de janeiro de 2013



13 de janeiro de 2013 | N° 17311
VERISSIMO

Momentos “aaah”

São os pequenos prazeres que nos reconciliam com a vida

Temos momentos de êxtase, de arrebatamento, de profunda satisfação pessoal, mas também temos pequenos prazeres passageiros, os chamados momentos aaah da vida.

Exemplo: você está com uma sede de perdido no deserto. É um Lawrence da Arábia sem o cantil. Sua boca é uma caverna poeirenta. Sua língua é uma bola de aniagem, percorrida por lagartixas secas e ressentidas. Nada abaterá sua sede, salvo uma... E lá vem ela. Uma Coca-Cola com gelo num copo longo (rodela de limão opcional) que você toma em dois goles, e depois do primeiro gole invariavelmente faz “aaah!”

Você chega de viagem cansado, resignado a tudo que passou e certamente passará antes de poder sair do aeroporto, e de repente vê (“aaah”) que a primeira mala a aparecer na esteira é a sua.

Coceira nas costas. Ninguém por perto íntimo o bastante para você pedir “Me coça atrás?”. Esfregar as costas numa quina pareceria estranho. Rolar no chão, mais ainda. Você tenta usar sua caneta para coçar atrás mas a caneta é curta, não alcança o ponto. A coceira aumenta. O que fazer?

Você pensa: preciso de alguma coisa do tamanho certo para chegar na coceira. Um galho de árvore. Melhor ainda: uma régua. Um cassetete! Claro. Pedir o cassetete emprestado de um policial. Ele é um servidor publico. Não precisa ser um conhecido, estará prestando um serviço publico, ajudando um cidadão a se coçar. Você pede o cassetete emprestado. É do tamanho exato. Aaaaaaaah.

Claro que o policial pode entender mal seu pedido e baixar o cassetete nas suas costas. O que também ajuda.

Você vai ao cinema. A poltrona é confortável. Você olha em volta e vê que não tem ninguém sentado perto de você. Ninguém para conversar durante o filme ou fazer barulho comendo pipoca ou desembrulhando doce. A sessão começa. A projeção é perfeita. Você se acomoda na poltrona e faz um merecido “aaah”.

Chuveiro na temperatura certa, outro momento “aaah” (em contraste com chuveiro inesperadamente frio, um momento “ui!”). Um pôr de sol especialmente criativo. Neta que passa o dia se recusando a lhe dar um beijo, alegando falta de tempo, mas depois vem correndo e se atira na sua barriga. Ambrosia diet, a maior invenção do homem depois da escada rolante. Ir para a cama de noite, pensar no que tem para fazer no dia seguinte e se dar conta que o dia seguinte é domingo e não há nada para fazer. Aaaah...

Enfim: são os momentos “aaah” que compensam os outros, são os pequenos prazeres que nos reconciliam com a vida. E isto que eu nem falei em sesta de sofá, diferente de sesta de cama e muito diferente de sesta de pijama, que é a sua versão oficial. Aaah, um bom sofá...

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