terça-feira, 29 de janeiro de 2013



29 de janeiro de 2013 | N° 17327
ARTIGOS - J.J. Camargo*

A pior dor

As grandes tragédias nos comovem porque nos transportam para dentro delas. E ficamos lá, durante dias, embalados pela discussão dos detalhes, pela tentativa infrutífera de reparar e, quando nos convencemos por exaustão de que nada mais é remediável, nos vemos a discutir os culpados, a criminosa falta de responsabilidade na emissão dos alvarás e as penas que deveriam receber. E ficamos indignados porque nada muda e, quando se repetir, sairemos outra vez atrás de novos culpados.

Mas nada disso passa nem perto dos sentimentos dos que perderam, porque a dor da perda é única e indescritível. A perda verdadeira e definitiva.

No máximo, podemos imaginar a partir de retalhos capturados nas declarações, o tamanho do sofrimento, mas não o sofrimento coletivo, porque este é sempre passageiro, mas o sofrimento individual, de cada pai e de cada mãe, que foram despertados com o relato de uma tragédia e descobriram petrificados que as luzes embaixo das portas continuavam acesas, porque seus filhos amados não retornaram da noitada.

Imaginem a saída para a rua depois de dezenas de telefonemas inúteis e a descoberta de que havia três possibilidades: mortos estendidos no piso de ginásio municipal, feridos hospitalizados em Santa Maria, feridos mais graves encaminhados para Porto Alegre.

Por onde começar a investigar, no meio de um tumulto, onde estariam a Bruna, o Rafael ou o Eduardo, se todas as pessoas gritavam e ninguém tinha uma informação confiável?

Quando a imprensa acessou o ginásio, reportou que corpos acomodados na lona preta pareciam intactos, visto que a maioria morreu asfixiada e não por queimaduras. Mas o que mais impressionou foi o relato de que os celulares seguiam tocando incansavelmente nos bolsos dos mortos.

E, quando um repórter tomou um deles, havia um registro a documentar todo o desespero, a perseverança e a incredulidade: “103 chamadas não atendidas”.

E no alto da tela o nome mais previsível: MÃE.

*MÉDICO

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