14
de janeiro de 2013 | N° 17312
ARTIGOS
- Paulo Broassard*
Quando menos se espera
Tinha
o propósito de prosseguir na análise da novela do PIB que virou Pibinho e a
senhora presidente pretende passe a Pibão. Mas, a despeito da real importância
do assunto, vou deixá-lo à margem por uma ou duas semanas, até porque o formidável
fiasco do crescimento do PIB de 2012, que não chegou a 1%, não permite que dele
se esqueça em dias.
Vamos
ao caso que me afastou do PIB. Estou realmente impressionado com o que está acontecendo
no mercado internacional com ônus às exportações de carne do Brasil, que vinham
se expandindo em vários níveis. Até onde se sabe, a causa residiria em uma notícia,
segundo a qual no Paraná teria ocorrido um caso de “vaca louca”, o que, ao que
se sabe, não é correto; não obstante, isto levou nove países a suspender a
importação de carne bovina brasileira, em termos globais ou limitados, o que
importou na queda de receitas em mais de US$ 7 bilhões.
Tratar-se-ia
de uma única vaca, morta de raiva, em 2010, segundo um laboratório que teria
encontrado material semelhante ao da “vaca louca”. Ora, o mal da “vaca louca” é
inconfundível com o da raiva. São males diferentes, de causas distintas.
É claro
que não pretendo discutir o mérito de suposto laudo ou coisa que o valha, mas
apreciar aspectos, que um bacharel possuidor de algum conhecimento e gosto pela
vida rural (e seus problemas) pode fazer. Salta aos olhos que o exame biológico
desta única vaca, ao que consta, até agora não estaria concluído. Além disso, o
rebanho bovino brasileiro é superior a 200 milhões de cabeças e entre nós nunca
houve um surto de mal da “vaca louca” como na Grã-Bretanha.
Não
tenho notícia da qualificação científica do laboratório em causa, mas as
circunstâncias não autorizam se conclua com segurança a boa ou má possível
correção do laudo, ainda inconcluso, salvo engano. De qualquer sorte, pelos
dados conhecidos, parece não serem bastantes a legitimar a condenação das
carnes brasileiras, notória e reconhecidamente de qualidade excelente, e ainda
com base em notícia controversa e incerta.
Não
me parece descabido que no mundo cheio de dificuldades, interesses
desconhecidos possam alimentar, por exemplo, propósitos tendentes ao
aviltamento de preços. Afinal, nos “meneios da mercância”, expressão do meu
saudoso professor Hernani Estrella, há luzes e sombras a recomendar a dúvida
metódica em relação a situações incertas e improvadas, de origem duvidosa e
aptas à proliferação de preconceitos encomendados.
Enfim,
o que é certo é que a raiva deriva de vírus transmitido pelo morcego, cachorro,
ovelha e cabra, enquanto o “mal da vaca louca” é veiculado pela alimentação
quando na ração ingressam restos de seres vivos, como carcaças.
Antes
de encerrar essa digressão, devo pedir clemência aos doutos mestres da ciência
veterinária pela invasão em suas áreas, reconhecendo que meus conhecimentos a
respeito são do tempo em que “vivar o casco” era medida para curar bicheira...
Outrossim,
mutatis mutandis, o caso lembra o da carne de Chernobyl, que durante dois anos
ou mais dividiu opiniões, inclusive jurídicas, no suposto de que fosse imprópria
ao consumo humano por conter radioatividade, enquanto outros defendiam que sua
utilização não teria nenhum inconveniente.
A
querela terminou quando o então ministro da Justiça provocou parecer de três
sumidades que, por unanimidade, concluíram que “a carne de Chernobyl” não
oferecia qualquer risco ao homem e, olhando pela janela do ministério,
comentaram eles que na grama que se estendia dali e de frente ao Congresso
havia mais radioatividade do que na malfadada “carne de Chernobyl”, desastradamente
importada da Ucrânia, então União Soviética.
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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