28
de janeiro de 2013 | N° 17326
HUMBERTO
TREZZI
A pior
notícia
*Santa
Maria
Escorada
no ombro de familiares, a mulher com vestido azul e calça branca sai da parte
menor do ginásio, tenta sentar em uma cadeira de plástico e desaba, indo ao
chão com estrondo.
–
Médico, médico! – gritam, desesperados, os parentes da senhora, que acaba de
reconhecer o filho de 20 anos como um dos mais de 200 mortos na tragédia da
danceteria Kiss.
Um
grupo de enfermeiras e psicólogas, com esparadrapos identificatórios no lugar
de improvisados crachás, acode a mãe, que não para de gritar:
–
Meu filho, meu filho! Eu quero meu filho, tragam meu filho de volta!
Mas
ele não volta.
Assim
como não voltarão dezenas de jovens cujos parentes tinham, desde o final da
manhã da ontem, a missão de identificar as vítimas do incêndio, o maior
desastre já ocorrido no país desde a década de 1960.
Zero
Hora acompanhou, de dentro do Centro Desportivo Municipal, o Farrezão
(homenagem ao ex-prefeito santa-mariense e atual vice, José Farret), a dor de
quem perdeu o familiar na flor da idade. Tia e madrinha do rapaz cuja mãe se
desesperava, uma comerciária de 48 anos mal conseguia falar. Ela e o marido
reconheceram o jovem em meio à montanha de corpos que se formou inicialmente em
uma das alas do ginásio. Inconfundível, porque estava pilchado, “gaudério” como
sempre foi. Tanto que tinha ido à boate, como sempre fazia, para curtir um
grupo de fandango. Morreu pisoteado e asfixiado, como a maioria.
–
Estou tão nervosa que voltei a fumar – desabafou ela, acendendo um cigarro no
outro.
O
ginásio parecia um formigueiro, tomado por centenas de voluntários que
acorreram ao chamado de ajuda feito por meio das rádios. Além de médicos e
psicólogos, compareceram assistentes sociais, enfermeiros, soldados e
policiais. Muitos em chinelos de dedo e bermuda, que emergência não combina com
etiqueta. Um jovem de branco, cabelo despenteado, comentou com colegas:
– O
Exército me convocou. Eu não estava de plantão, mas tinha de ajudar. Conheço
gente que estava na boate.
Adeus
na Sala do Desespero
A
maioria dos voluntários nem conhecia vítimas e, mesmo assim, se dispôs a sair
do conforto caseiro para o cenário de guerra em que se transformou o centro de
Santa Maria na madrugada de domingo. A confusão era tanta que mesmo quem queria
ajudar tinha de ter crachá para passar por uma sólida barreira formada por PMs
do Batalhão de Operações Especiais de Santa Maria. Assim que ingressava, o voluntário
recebia uma etiqueta para colar na roupa, com nome e profissão anotados. Aí,
era designado, pelo Comitê de Crise, para consolar parentes, ministrar
medicamentos ou examinar os corpos.
Foi
por volta do meio-dia de ontem, sob um calor sufocante, que os familiares, em
fila, começaram a entrar na Sala do Desespero. Assim foi apelidado o local onde
os corpos eram depositados, um ginásio menor do que o Farrezão, mas também
situado no CDM. Gritos, lágrimas e desmaios se sucediam, em sequência. Um vaivém
desesperado que incluía o uivo da sirene de ambulâncias, a gritaria de
policiais e o entra e sai de agentes funerários, trazendo mais cadáveres. Todos
jovens que a tragédia ceifou.
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