sábado, 8 de setembro de 2012


RUTH DE AQUINO - 06/09/2012 12h09

O futuro chegou, Dilma

A fofoca da semana envolve o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a presidenta (assim mesmo, com “a”) Dilma Rousseff – pois é assim que FHC se referiu a ela, e é assim que o Palácio e os apparatchiks a tratam. Digo “fofoca” porque não vai mudar o país.

São esgrimas boas de ler e comentar no bar, são saias justas positivas para o jogo democrático porque revelam divergências em alto nível. Mas seu efeito colateral na baixa política, em tempo de eleição, é pernicioso.

Cada lado puxa para sua sardinha (ou o inverso, tanto faz) – e, nos cardumes à margem, as interpretações costumam ser menos inteligentes que os argumentos.
FHC e Dilma se comportaram como manda o figurino político, especialmente em época de eleição, quando o PT está fragilizado pelo mensalão e o PSDB está fragilizado por seu candidato pangaré em São Paulo, José Serra, que já deveria ter-se aposentado de disputas eleitorais.

Quanto mais Serra promete que não sairá da prefeitura para disputar a Presidência, mais ele mostra sua distância da realidade paulistana. Ninguém está preocupado com isso – talvez só o próprio PSDB, que não imagina Serra querendo ser presidente mais uma vez.

O candidato é o maior inimigo de si mesmo.

O artigo de FHC contém verdades incômodas sobre a herança de Lula. Cita o ministério-bomba, o mensalão-bomba, o sindicalismo-bomba, a Previdência-bomba, o populismo-bomba, tudo pronto a explodir no colo da companheira. Dilma é produto do governo passado. Mas já agiu em diversas situações de maneira oposta à de seu criador.

Dilma se sentiu obrigada a responder em nota oficial. Natural. Ela trocou bicadas amigáveis e cordiais com seu tucano favorito em eventos públicos. Mandou uma carta elogiosa a FHC nos seus 80 anos. É evidente que ficaria pessoalmente incomodada com um texto que a coloca como mera vítima das circunstâncias. Se existe uma herança de Lula, Dilma participou dela, para o bem e para o mal.

Na resposta a FHC, a presidente disse governar olhando para a frente. Se for sincera, melhor para o Brasil"

A nota de Dilma, bem mais curta, também contém verdades. Ela diz ter recebido “um país menos desigual, com 40 milhões de pessoas ascendendo à classe média”. Verdade. Afirma que Lula “não caiu na tentação de uma mudança constitucional que o beneficiasse”, na busca de um terceiro mandato. Verdade. Pode-se contrapor que Lula achava melhor descansar por quatro anos, colocando no Palácio uma técnica de sua confiança. Dilma lidaria sem rabo preso com as bombas prestes a explodir. E ele voltaria logo depois, para eternizar o PT no poder.

As maiores bobagens da semana ficaram a cargo dos correligionários. É demais ouvir do presidente do PSDB, Sérgio Guerra – logo ele, que sempre falou mais do que devia –, que “teria sido melhor para Dilma se ela tivesse ficado calada”. Ou o tom paternalista de Guerra: “Entendemos a presidente”. Como se Dilma tivesse sido torturada psicologicamente para responder. Ou, ainda, os militantes petistas comemorando “o fim da lua de mel” entre Dilma e FHC. Até parece.

É saudável ler, na nota da presidente, que “o passado deve nos servir de contraponto, de lição, de visão crítica, mas não de ressentimento”. Ela disse mais: “Aprendi com os erros e, principalmente, com os acertos de todas as administrações que me antecederam. Mas governo com os olhos no futuro”. Se for sincera, melhor para o Brasil.

Porque, no mundo real, as favelas continuarão a queimar em São Paulo, deixando milhares de famílias desabrigadas, dormindo ao relento em seus terrenos tostados, com medo de invasão de outros pobres sem-teto. Milhões de alunos continuarão a não aprender português nem matemática. Pacientes continuarão morrendo em filas de hospitais. Deputados e senadores continuarão a faltar ao trabalho e a mamar nas tetas dos eleitores.

Você lembra o Wilder Morais, ex da mulher do Cachoeira? Aquele que substituiu Demóstenes Torres no Senado? O que faz esse cidadão que ganhou R$ 16.300 por um dia de trabalho em julho? Interrompeu as férias, assinou o termo de posse, fez o juramento, viu a plaquinha com seu nome no gabinete número 13...

e se mandou com a família em férias novamente. Ele terá mais seis anos e meio de mandato. Ninguém mais comenta que Wilder teria de explicar melhor a relação com o bicheiro-lobista, que deve transcender a cessão de Andressa. O que faz Wilder hoje, além de tentar ser esquecido?

Nem tucanos nem petistas fizeram até hoje a revolução profunda e necessária na educação, na saúde e na habitação. E tampouco as reformas trabalhista e previdenciária, essenciais para desarmar uma superbomba. Não fizeram a reforma política para moralizar o Congresso, obrigar parlamentares a prestar contas e nos dar, enfim, gosto de votar. O futuro já chegou, Dilma.

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