sábado, 8 de setembro de 2012



08 de setembro de 2012 | N° 17186
PAULO SANT’ANA

As amígdalas

O descalabro da questão da saúde entre nós não é só no SUS, acontece também no setor de convênios.

Se nos convênios já há a grave irregularidade que vou denunciar, imaginem no SUS, onde os pacientes se empilham dramaticamente na fila das consultas e das cirurgias.

Eu vou pegar apenas um tipo de doença para exemplificar mais facilmente. Mas essa grave bagunça se verifica em outras dezenas de doenças.

Vou pegar as amígdalas. Os convênios pagam cerca de R$ 50 por cada paciente que é operado das amígdalas. O cirurgião opera o paciente e ganha R$ 50 do convênio.

Ora, imaginem aquele aparato que se forma em torno de uma sala cirúrgica para operar amígdalas: é aquela azáfama de enfermeiras, anestesistas, instrumentos etc.

E o cirurgião ganha apenas R$ 50 para fazer a cirurgia, pagos pelo convênio.

Agora é que preteia o olho da gateada: em razão desse baixo valor, muitos cirurgiões estão se recusando a operar amígdalas.

E agora vem a gravidade: alguns cirurgiões contraindicam o procedimento, ficam tratando o paciente com comprimidos e outros tipos de remédios para driblar os pacientes e as doenças, quando o que se tinha de fazer, que era a cirurgia de amígdalas, não é feito.

Uma barbaridade. E isso está acontecendo com outras dezenas de doenças, tudo pela baixa remuneração que ganham os médicos por cirurgias, algumas delas delicadas como a das próprias amígdalas, que podem sangrar e então se instalam as complicações.

Assim está a saúde no Brasil. É uma farsa gigantesca. São milhares de doentes que são embromados em clínicas e hospitais, têm de ser urgentemente alvos de cirurgia e são chutados por alguns médicos que se recusam a receber pouco por cirurgias inadiáveis.

No caso dos hospitais que mantêm clínicas anexas, os diretores médicos têm alta responsabilidade nessa grave irregularidade. Eles precisam fiscalizar e, infelizmente, obrigar os médicos a proceder às cirurgias, mesmo diante do baixo valor da remuneração pelos convênios. Isso não pode continuar assim.

Podem pensar alguns leitores que sou insensível à situação dos médicos, que ganham pouco por algumas cirurgias e por isso se escafedem de suas obrigações profissionais, condenando os doentes ao abandono do tratamento aconselhado.

Sou sensível a esse estado clamoroso da remuneração dos médicos, mas como jornalista tenho de ser mais sensível ao drama relatado dos pacientes.

O ainda mais grave é que os pacientes, leigos que são, ficam sem saber que doença têm e que ela tinha de ser atacada imediatamente por cirurgia e não por embromação de muitos médicos.

Chamo a atenção do Cremers, do Simers, dos secretários da Saúde do Estado e de Porto Alegre para essa grandiosa iniquidade.

Precisam debelá-la com urgência. Este meu depoimento foi fruto de demoradas observações profissionais minhas.

Só depois que me capacitei totalmente e detalhadamente dessa vergonhosa anomalia é que resolvi trazê-la a público.

Só falta eu advertir que qualquer cirurgia que seja driblada assim pode redundar em complicações terríveis e até trágicas, como a morte.

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