06 de outubro de 2013 |
N° 17575 VERISSIMO
As aventuras da família
Brasil
As desencaminhadoras
Sir Francis Bacon deu um conselho
curioso aos que estudavam a natureza. Disse que deveriam suspeitar de tudo que
suas mentes adotassem com muita satisfação. Era uma maneira de prevenir contra
a ilusão de que qualquer descoberta humana fosse completa, ou tivesse
completamente dispensado a vontade de Deus.
No momento (século 17) em que
crescia a ideia quase herética de que existia um livro da natureza tão cheio de
mensagens cifradas de Deus para os homens quanto a Bíblia, Bacon aconselhava a
ciência a não desprezar o que diziam os mitos e as escrituras. A vontade de
Deus se manifestava de várias formas, algumas eram apenas mais poéticas do que
as outras.
A primeira “mensagem” assim
identificada do livro secular da natureza foi o magnetismo, que os gregos e romanos
já conheciam e os chineses já usavam na navegação, mas que só começou a ser
estudado a fundo pelo inglês William Gilbert, contemporâneo de Francis Bacon na
corte da rainha Elizabeth I, de quem era médico.
O magnetismo era a prototípica
evidência de uma força invisível na natureza, a primeira alternativa à pura
intenção de Deus por trás de tudo. Gilbert, que chamava a força magnética de
“alma” da Terra, deduziu que todo o planeta era uma pedra magnética e que os
imãs eram filhos da Terra, com quem ela compartilhava seu poder. E recorreu à
linguagem poética, no caso erótica, para descrever a origem do ferro e da sua
misteriosa propriedade, no ventre profundo do globo, igual a “o sangue e o
sêmen na geração dos animais”.
Na linguagem poética dos mitos, o
poder da Mãe Terra sobre o destino dos homens é anterior às descobertas de
Gilbert. São muitas as forças femininas que norteiam a vida dos homens e os
atraem para o conhecimento, o sucesso ou a ruína – ou tentam.
Desde Eva, culpada por termos
trocado o paraíso eterno pelo saber, o sexo e a morte, passando pela Esfinge
com suas charadas didáticas e por todas as musas inspiradoras, sereias
tentadoras e ninfas sedutoras, e todas as gerações e gerações de companheiras
de fé ou desencaminhadoras fatais que nos mantiveram no rumo ou nos
desencaminharam, são todas filhas da grande mãe magnética, nos guiando pelo
mundo.
Albert Einstein contava que ao
ganhar uma bússola, quando era menino, teve a primeira sensação de uma força
misteriosa por trás de tudo, e o primeiro ímpeto de desvendá-la. Mais do que
ninguém, Einstein podia dizer que substituíra Deus pela Natureza na explicação
do mundo, mas ele nunca abandonou sua devoção quase religiosa a um determinismo
harmônico do Universo, cedendo a Deus, ou a que outro nome se quisesse dar ao
indesvendável, esse último mistério, só alcançável pela metáfora.
Mas Einstein não seguiu o
conselho de Francis Bacon de desconfiar do que o satisfazia.
Satisfez-se tanto com suas
certezas que passou os últimos anos da vida buscando uma teoria unificada da
gravidade e do eletromagnetismo que refutasse a teoria quântica que as
ameaçava, e tornava a matéria e seu comportamento inexplicáveis em qualquer
linguagem, científica ou a poética. Pois aceitá-la seria aceitar um universo regido
pelo acaso, ou pela estupidez. Ou tornado absolutamente obscuro por um Deus
ciumento.
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