13 de outubro de 2013 |
N° 17582
FABRÍCIO CARPINEJAR
Agradeço sua tristeza
Nunca fui um bom companheiro da
tristeza de ninguém.
Quando as ex ficavam chateadas,
reclamavam que eu não sabia me comportar, que eu não respeitava o espaço, que
buscava divertir e não era o momento, que inventava piadas atrasadas, que minha
insistência otimista desagradava.
Precisava acompanhar o tango de
Gardel: não podia me mexer, nem respirar. Qualquer coisa que eu fizesse vinha a
ser considerada incômoda e inoportuna. Herdava como missão sair de perto, não
segurar a mão, não abraçar, não beijar, não rodear, não perguntar, não
responder.
Enfim, havia a obrigação de
desaparecer, senão a tristeza migrava para o pânico e depois pagaria a conta.
Não cabia me aproximar, trocar de
canal, existir.
Eu me prontificava a escutá-las e
ganhava um cartel de críticas, me prontificava a falar e citar exemplos de
superação e recebia patadas.
Não absorvia a fórmula. Tranquilo
respeitar a tristeza do outro, entendo, guardo os meus aborrecimentos, mas não
via sentido em promover a tristeza, incentivar a tristeza, festejar a tristeza.
Na minha perspectiva, a mágoa se
assemelha a uma trégua, um intervalo musical, um momento repentino (ou devo ser
mesmo muito amador para sofrer e não estava preparado para a vida profissional
das lágrimas).
Com Katy, é diferente. Até a tristeza
dela aceitou casar comigo.
Sua tristeza não é arrogante,
áspera, não me sinto intruso. Minha mulher se cala por uma hora, com os olhos
boiando pela casa, nadando em seu silêncio de sereia. Posso passar próximo,
acariciar seus cabelos, tocar em seu rosto, oferecer um copo d’água, que não
serei denunciado por maus-tratos.
Ela é triste em seus pensamentos,
mas não é sádica nos gestos. Não me obriga a repeti-la, muito menos julga minha
diferença de tratamento. Não recrimina minha presença ou a disposição otimista.
Acolhe-me a distância, sem distanciamento, como se estivesse me mirando no
apartamento envidraçado da frente.
Depois de cumprir seu ritual,
regressa para mim com um riso inocente:
— Desculpa minha tristeza.
E me abraça ternamente, girando o
rosto como uma chave em meus ombros.
A tristeza de Katy ainda por cima
é educada.
Só tenho vontade de agradecer.
Dizer obrigado para sua tristeza.
Dizer para sua tristeza: volte
sempre.
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