17 de outubro de 2013 |
N° 17586
ARTIGOS - Sebastião Ventura
Pereira da Paixão Jr.*
Déficit de legalidade e cidadania
A ideia é simples: quanto mais a
lei é aplicada, melhores são as instituições; por outro lado, quanto menos a
lei é prestigiada, maior o grau de degeneração institucional. Vamos, então,
deixar as subjetividades de lado e passar a casos objetivos: a Constituição,
por exemplo, assegura o respeito à integridade física e moral dos presos,
determina que o salário mínimo deve ser capaz de atender as necessidades de
moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e
previdência social e, por último, diz em alto e bom som que moralidade e
eficiência são princípios da administração pública brasileira.
Tais regras, no entanto, só existem
no papel, pois os presídios são caóticos, o salário mínimo praticamente se
esvai em moradias precárias e magra alimentação, enquanto que moralidade é uma
palavra desconhecida da política, assim como eficiência é uma nota proibida no
sarau da burocracia brasileira.
Moral da história: a lei no
Brasil é, muitas vezes, uma simples miragem no deserto da incompetência
política. E, quanto maior a incompetência da política, mais distante a
Constituição fica da realidade da vida. Em outras palavras, é a política a
nobre arte humana de dar cores ao preto e branco da norma sobre o papel. Logo,
a aridez da vida pública nacional revela que nossos políticos, com honrosas
exceções, são simples artistas de um teatro profano. O preocupante é que a
situação, ao invés de melhorar, mais empalidece a cada nova primavera.
Outro dado sintomático de que a
lei não funciona no Brasil está no vertiginoso aumento da litigiosidade
judicial, ou seja, se há litígio, é porque a lei não foi cumprida em alguma
medida, criando um conflito de interesses entre as partes envolvidas. É claro
que algum espírito mais benevolente poderá sustentar o contrário: o aumento da
litigiosidade, ao invés da fragilidade institucional da lei, revela justamente
que as pessoas estão indo atrás de seus direitos. A premissa é bonita, mas é
logicamente falsa. Afinal, se as pessoas precisam ir atrás de direitos, é
porque, na prática, não os têm.
Na verdade, a lei no Brasil é
como aquela imagem do macaco correndo atrás da banana: no início, o macaquinho
corre, corre, corre, e nada; chega um momento em que o pobre mortal, exausto de
tanto correr, desiste e, aí, o que ele faz? Bate na porta do Judiciário em
busca de justiça. Tal fenômeno vem acontecendo sistematicamente em nosso país e
bem revela que muitos de nossos direitos precisam de um ato judicial para serem
efetivados.
No final, além da fadiga dos
materiais que funcionam, restará a amarga evidência de que a lei brasileira
promete muito, mas a política faz muito pouco. Sim, a política está
definitivamente mal e degradante. Mas e nós, como cidadãos e sociedade civil, o
que temos feito de positivo para mudar esse quadro desolador?
*ADVOGADO, ESPECIALISTA
DO INSTITUTO MILLENIUM
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