sábado, 12 de outubro de 2013


12 de outubro de 2013 | N° 17581
NILSON SOUZA

Mancha na biografia

Por sugestão do meu amigo Lemyr Martins, talentoso jornalista, comprei há muitos anos um livro do escritor britânico Henry Thomas, chamado A História da Raça Humana Através da Biografia. Nunca mais me separei dele. Já li e reli muitas vezes seus relatos sobre seres humanos que fizeram a diferença nesta nossa caminhada pelo planeta, para o bem e para o mal.

Desfilam ao longo da obra, entre outros, personagens como Moisés, Buda, Confúcio, Platão, Jesus Cristo, Nero, Marco Polo, Colombo, Lutero, Darwin, Shakespeare, Voltaire, Goethe, Lenin, Gandhi e Hitler. Thomas os divide em dois grupos fundamentais: o dos que procuraram melhorar a civilização e o dos que a retardam. São biografias de profetas, guerreiros, poetas, filósofos, cientistas, exploradores e estadistas, escritas com paixão e com confessado posicionamento. O autor não deixa dúvida sobre sua admiração ou repulsa pelos biografados, e manifesta clara preferência pelos pacifistas.

Lembrei-me desse livro especial ao ler sobre o debate que se trava no país em torno dos livros biográficos. Sob o pretexto de que se trata de censura, escritores querem retirar do Código Civil a necessidade de autorização prévia dos biografados e de seus familiares para que uma obra possa ser publicada. Artistas e outras celebridades, capitaneados por Caetano Veloso, Chico Buarque e Roberto Carlos, querem manter o veto, sob a alegação de que os biógrafos ganham dinheiro à custa de seus personagens e nem sempre escrevem o que eles gostariam de ver divulgado sobre suas vidas.

Sou pela plena liberdade de expressão, já vou dizendo, especialmente de figuras públicas. Biografias independentes contribuem para o melhor entendimento da história – como bem mostra o livro de Henry Thomas. Obviamente, os biografados e seus familiares têm todo o direito de recorrer à Justiça para reclamar de eventuais distorções, incluindo-se aí a cobrança de indenização por dano moral quando houver difamação. Mas impedir a publicação de um livro é censura prévia, fere a Constituição.

Custo a entender a posição dos nossos artistas, especialmente desses que sempre estiveram no grupo dos que melhoram a civilização. Temo que, com essa posição equivocada, estejam comprometendo as próprias biografias. Se pudesse meter a minha colher neste debate, mandaria os seguintes recados a eles:

– Caetano, não caminhe contra o vento da liberdade!

– Chico, afasta de nós este cálice amargo!


– Roberto, vamos gozar a liberdade de uma vida sem frescura – e sem censura!

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