sexta-feira, 11 de outubro de 2013


Jaime Cimenti

Não é só pelas casas da Luciana de Abreu

Quando escrevo estas linhas, deve estar correndo o prazo para que o Ministério Público e a empresa construtora cheguem a um acordo sobre o terreno e as casas da Luciana de Abreu. Pode ser que até esta sexta-feira, quando este texto for publicado, as partes já tenham conciliado.

Se não houver acordo, o processo seguirá. Independentemente do resultado das negociações, do julgamento final do Judiciário e da palavra final do município de Porto Alegre, que virão a seu tempo, o tema despertou e desperta saudáveis debates nas casas, nos bares, restaurantes, ruas, praças e em vários canais de mídia. Mario Quintana escreveu que não gostava de arquitetura moderna porque ela não sabia fazer casas antigas.

O genial arquiteto norte-americano Frank Lloyd Wright criticava a altura exagerada dos arranha-céus, especialmente os de Nova Iorque. A questão das casas da Luciana transcende - e muito - os limites do terreno, das paredes das residências, das plantas, dos documentos e das questões administrativas e judiciais do caso.

Um dia serão solucionadas. Espera-se que da melhor forma possível. Casas antigas lembram tempos mais lentos, talvez mais elegantes, galinheiros nos quintais, gatos, sapos, cachorros, hortas, velhos parentes, lembranças de infância, gramados, flores, passarinhos, jardins, árvores frutíferas, momentos familiares de alegria e tristeza, lágrimas e sorrisos do passado, tempos de glória e de decadência e infindáveis histórias de pessoas e de vidas. Casas antigas são muito mais do que pisos, paredes, janelas, escadas, tetos e telhados.

Mesmo quem nunca morou em uma casa sabe do que estou falando. Enfim, casas antigas são raízes e céus, são sonhos, memórias inventadas ou não, e lembranças. A vida é sonho e os sonhos, sonhos são, escreveu Pedro Calderón de la Barca há séculos. A casa onde eu vivi meus primeiros anos, no interior, tinha anões de jardim, gramado para jogar bola e até um pequeno parreiral. Não existe mais.

Quem a desenhou e a construiu, com grande carinho, foi meu pai, que era geômetra. Ficaram as fotos, as lembranças e as energias. Prefiro não lembrar da primeira vez que passei por lá e senti  que a casa tinha ficado em pé só nos alicerces da memória.

Coisas da vida, o tal do progresso, a roda-viva girando, o tempo. Construções, desconstruções, moderno, pós-moderno, vida e morte, perdas e ganhos, mas com Vivaldi e a primavera sempre chegando, sagrados, acima das dores e dos prazeres de nossas rápidas, lindas e tumultuadas passagens pelo planeta.

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