quinta-feira, 4 de julho de 2013

O murro merecido


04 de julho de 2013 | N° 17481
PAULO SANT’ANA

O murro merecido

De repente, surgiu à minha frente, num corredor, um homem que odeio com todas as forças da minha ira.

Tive um ímpeto cerebrino de esmurrar na cara aquele homem a quem dedico todo o meu ódio por ter sido canalhamente invejoso comigo, mas me contive. E o meu homem odiado passou por mim invicto da minha fúria.

A ideia de esmurrar o homem saiu do encéfalo absconso que a constringe, o cérebro, percorreu metade do meu corpo e estancou no meu punho.

É que outra ideia sucedeu-a com o bom senso, se eu esmurrasse aquele homem atlético, ele reagiria e com toda a certeza eu levaria a pior com sua reação.

E também deve ter-me vindo à cabeça uma terceira ideia: de que adiantaria eu esmurrar a cara daquele homem, o meu ódio cessaria?

Como notam os meus leitores, nessa corajosa confissão de meu ódio por uma pessoa, o ódio é intrínseco a muitos corações, o meu inclusive.

O ódio remói a gente, é um sentimento inferior, teria de

ser mais próprio dos animais, mas eu desconfio que os animais não odeiam, se eles investem em fúria contra alguém deve ser porque movidos por outro sentimento instintivo que não é o ódio.

Quando Jesus Cristo disse que ao agressor que nos esbofeteou a face esquerda devemos oferecer a face direita, quis dizer que a suprema manifestação de amor é o perdão.

Mas eu não consigo perdoar o safado que odeio. Só não o esmurrei por oportunismo interesseiro.

A impressão que tenho é que nunca irei perdoá-lo, isso em suma é o ódio, a incapacidade de perdoar.

Fico imaginando que em várias ocasiões eu é que merecia ser esmurrado por alguém e acabei não sendo agredido, talvez pelas mesmas razões que me fizeram recuar de esmurrar o patife aquele no corredor.

A banca paga e recebe – continuo imaginando –, um dia a gente odeia e no outro é odiado.

E será que me perdoaram os que me odiaram e não me agrediram, ou simplesmente esqueceram?

Parece que eu nunca vou esquecer o sevandija. Porque o que ele fez comigo foi profundamente injusto, iníquo.

Ele sabe que foi infame comigo, velhaco, insolente.

E a minha única vingança é imaginar que ele se contorce na convicção de que errou gravemente comigo, e apenas não me vem confessar isso por orgulho.


Mas secreta e envergonhadamente cultivo um remorso: o de não ter esmurrado aquele vil personagem das minhas relações.

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