06
de julho de 2013 | N° 17483
ARTIGOS
-LINA APARECIDA ZARDO*
A falácia da falta de
médicos
Contrariando
o parecer de todas as entidades médicas brasileiras, o governo insiste na
proposta de trazer médicos estrangeiros para o nosso país. Conforme a
Organização Mundial de Saúde, a OMS, temos aqui profissionais suficientes e até
algum excesso. O que temos é a concentração dos mesmos nas cidades grandes e
carência nas regiões metropolitanas e em cidades pequenas ou distantes.
Os
médicos preferem instalar-se onde há mais recursos tecnológicos, maior chance
de trabalho, mais apoio logístico, mais conforto para viver.
Durante
o curso de formação médica, os estudantes foram (são) treinados
predominantemente com pacientes hospitalizados onde há todos os recursos para
investigação e tratamento, e pouco tempo é dedicado ao estudo e prática com
pacientes de ambulatório que são a porta de entrada para o Sistema Público de
Saúde.
Uma
pesquisa epidemiológica clássica mostrou que para 100 indivíduos que procuram
atendimento de saúde, 87 apresentam queixas solucionáveis no próprio local (com
retornos e acompanhamento), oito necessitam exames complementares e/ou
especialistas e cinco devem ser encaminhados a um hospital. Assim que a maior
necessidade em saúde da população é saber ouvir o paciente, estabelecer
vínculos com ele, dialogar sobre suas alterações de saúde e seu estilo de vida.
Há
pouco treinamento para esta abordagem que não utiliza os modernos e
sofisticados exames de investigação e, além disto, considera-se de menos valia
este trabalho em que cada médico realiza sua ciência e arte num corpo a corpo
com o paciente. As consultas médicas, tanto no SUS como nos convênios, são a
tarefa mais mal remunerada da medicina. E também são vistas como de menor
prestígio profissional e social.
Nunca
foi planejado e organizado um programa de incentivo para alocar médicos em
localidades pequenas e/ou distantes nas quais há poucos recursos
complementares. Tem de haver lá um mínimo de apoio técnico complementar local,
como laboratório básico, exames básicos de imagem, outros profissionais em
equipe, transporte de pacientes para o hospital regional mais próximo e uma
supervisão competente.
Outro
obstáculo é a ausência de uma carreira de trabalho para o médico da saúde
pública. Esta asseguraria rendimentos fixos, progressão e estabilidade
profissionais, chance de evolução por critérios preeestabelecidos e/ou por
mérito de avaliação.
Não
há vagas para todos os formandos de medicina nos estágios de residência e menos
ainda para treinamento em Saúde da Família ou Saúde Pública. Por estes dias o
governo aumentou a remuneração da bolsa de residência e promete abrir vagas
para que todos os formandos tenham seu estágio de treinamento garantido.
Não
há necessidade de mais escolas médicas no país. Temos 149, número similar ao da
China e da Índia, países de população muito maior que a nossa. Precisamos sim
avaliar e aprimorar o ensino das já existentes. Um exame realizado no Estado de
São Paulo, em 2012, em médicos recém-formados, encontrou reprovação em 53%
deles. Assim que, antes de trazer médicos estrangeiros, é preciso “arrumar a
casa”.
*Pediatra/hebiatra,
professora universitária aposentada
*PEDIATRA/HEBIATRA,
PROFESSORA UNIVERSITÁRIA APOSENTADA
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